Recursos
PRIMEIRA PARTE
I.
Considerações Gerais. Conceito. Princípios. Pressupostos e Requisitos. Efeitos.
Classificação.
I.1 Considerações Gerais
Quando se examina o tema relativo aos
recursos, em
Direito Processual , a primeira observação que tem de ser
levada em conta é a advertência da doutrina no sentido de que qualquer
conceituação deve partir de um dado direito positivo. Não há possibilidade de
encontrar um conceito amplo, geral e irrestrito, que seja capaz de englobar o
que se tem por recurso nos diversos ordenamentos jurídicos.
De
outra banda, parecer que o legislador fez bem em não
conceituar o instituto porque, antes não conceituar do que conceituar mal (o
que ocorreu com diversos outros institutos no Código de Processo Civil, como o
litisconsórcio necessário e a coisa julgada). Deveras, um simples exame da
doutrina mais à mão deixa claro que, mesmo havendo parcial convergência de
opiniões entre os doutrinadores, nenhuma e igual a outra sobre a adequada e
completa definição do termo.
Demais disso, impende considerar que nos
estreitos limites deste estudo, mais uma apostila do que qualquer outra coisa,
não se poderia ter inovar ou tentar criar uma teoria geral do direito recursal,
motivo, motivo por que afirmamos a necessidade de serem consultadas outras
obras, além deste escrito e das indicadas na bibliografia.
A necessidade de ser ouvido mais de uma
vez sobre o mesmo caso é quase um imperativo antropológico. Percebe-se isso até
no seio familiar, em que as crianças, contrariadas pelo pai no atendimento de
seus desejos, procuram a figura materna, como a pedir abrigo à pretensão
exercida. Se contrariadas pela mãe, num primeiro momento, dirigem-se ao pai,
sempre na tentativa de ver acolhido seu pleito.
E assim é porque, como diz Leo Rosenberg:
"Toda resolucion puede ser
injusta, y casi siempre la tendra par tal parte vencida. Par eso, los recursos
estan al scervicio de los legitimos deseos de las partes de substituir la resolucion
que les es desfavorable por outra mas favorable" [1].
Na
seara do direito, os recursos servem para apaziguar os espíritos e funcionam
como uma segunda força de convencimento sobre aquele que teve seus interesses
contrariados pelo Estado, aquele que foi de alguma forma, vencido.
Além dessa função, os recursos também
são um importante "meio de manutenção e controle da unidade do
direito".[2]. Isso porque existe a necessidade de o
detentor do monopólio da jurisdição assegurar ao jurisdicionado as condições de
satisfação que constituem a promessa implícita de todos os ordenamentos
jurídicos escorados na idéia de estado democrático de direito (progresso
individual, bem comum, segurança jurídica, implementação do rol estipulado de
direitos fundamentais).
A idéia de recurso, para fins de
aproximação conceitual, está associada à de procedimento que permite a
releitura do processo, sentido esse expresso pelo dicionário com 'percorrer
novamente'. Assim, o recurso no segundo grau de jurisdição passa a ser
considerado como uma repetição do que ocorreu no primeiro grau.
É difundida a afirmação de
que, até pela origem latina do termo - recursus -, o recurso de natureza
processual teria origem em Roma, mais exatamente no período da cognitio extraordinem[3]. Embora seja
realmente muito importante para os povos ocidentais a vertente romana, o certo
é que muito antes do florescimento do direito romano, já se conhecia, essa
prática. Exemplos disso podem ser encontrados no livro do Êxodo (Bíblia Sagrada
– NVI, 2001, EX:18:13-26), em que se percebe uma estrutura judiciária centrada
na figura de Moisés:
No dia seguinte, Moisés assentou-se
para julgar as questões do povo, este permaneceu em pé diante dele, desde a
manhã até o cair da tarde. Quando o seu sogro viu tudo o que ele estava fazendo
pelo povo, disse: "Que é que você
está fazendo? Por que só você se assenta para julgar, e todo este povo o espera
em pé, desde a manhã até o cair da tarde?"
Moisés lhe respondeu: "O povo me
procura para que eu consulte a Deus. Toda vez que alguém tem uma questão, esta
me é trazida, e eu decido entre as partes, e ensino-lhes os decretos e a lei de
Deus".
Respondeu o sogro de Moisés: "O
que você esta fazendo não é bom. Você e o seu povo ficarão esgotados, pois essa
tarefa lhe é pesada demais. Você não pode executá-la sozinho. Agora, ouça-me!
Eu lhe darei um conselho, e que Deus esteja com você! Seja você o representante
do povo diante de Deus e leve a Deus as suas questões. Oriente-os quanto aos decretos
e leis, mostrando-lhes como devem viver e o que devem fazer. Mas escolha dentre
todo o povo homens capazes, tementes a Deus, dignos de confiança e inimigos de
ganho desonesto. Estabeleça-os como chefes de mil, de cem, de cinquenta e de
dez. Eles estarão sempre à disposição do povo para julgar as questões. Trarão a
você apenas as questões difíceis; as mais simples decidirão sozinhos. Isso
tornará mais leve o seu fardo, porque eles o dividirão com você. Se você assim
fizer, e se assim Deus ordenar, você será capaz de suportar as dificuldades, e
todo este povo voltara para casa satisfeito".
Moisés aceitou o conselho do sogro e
fez tudo como ele tinha sugerido. Escolheu homens capazes de todo o Israel e
colocou-os como líderes do povo: chefes de mil, de cem, de cinquenta e de dez.
Estes ficaram como juízes permanentes do povo. As questões difíceis levavam a
Moisés; as mais simples, porém, eles mesmos resolviam.
Esses fatos teriam ocorrido há 3.451
anos, muito tempo antes, portanto, do florescimento do Direito Romano.
É
certo, entretanto, que, para os povos ocidentais, mais interessa o que se passa
a partir do direito romano, sobretudo a partir do período da cognitio extraordinaria em diante,
quando, em decorrência da extinção das duas fases processuais (primeiro havia
uma fase in jure, que se passava
perante um funcionário do Estado; depois havia uma fase in judicio, que se passava perante um juiz privado, que não fazia
parte da estrutura de poder estatal e que não se subordinava a ninguém) que marcaram
os dois períodos anteriores em que se divide o Direito Romano (período das
ações da lei e período formulário), começa a ganhar forma a figura da appelatio como uma maneira de recorrer
ao detentor do poder político.
Essa
tendência consagrou-se, mais tarde, no Corpus
Juris Civilis e daí em diante acompanhou todo o evolver da civilização. É
indicado como certo, entretanto, que a Revolução francesa seria origem do
reexame e do duplo grau de jurisdição. As fontes históricas não admitem essa
conclusão, embora seja admissível dizer que, com a Revolução, houve um maior
grau de institucionalização do duplo grau de jurisdição, que é a base lógica da
existência dos recursos.
No Brasil, que é, no particular,
tributário do Direito Português, as origens dos recursos podem ser buscadas
desde as Ordenações Afonsinas, passando pelas Ordenações Manuelinas e pelas
Filipinas. A rigor, aliás, mais de duzentos anos antes da edição das Ordenações
Afonsinas — registra o professor Luís Carlos Azevedo[4] — mais exatamente durante o reinado de
D. Afonso III (1248 a
1279) tem-se com precisão a indicação do acolhimento da apelação (1254/1261)
como se fosse uma espécie de certidão de nascimento do direito recursal de
Portugal. Após esse momento legislativo, reafirmado por D. Dinis, sucessor de
D. Afonso III, solidificou-se a idéia de recurso — que, aliás, funcionava, em
muitos momentos, como elemento de confirmação do exercício do poder político
central — tendo passado com maior ou menor largueza para o direito das ordenações.
Com a instalação
dos Governos Gerais e com a chegada ao Brasil do Dr. Pero Borge, Ouvidor-Geral
(chefe da Justiça no Brasil colonial), em 1549, inicia-se o sistema recursal,
do qual o Ouvidor-Geral passa a ser a instância máxima, e a quem cabia julgar
os recursos das decisões dos juízes.
Em 1609 foi criada a primeira Relação — órgão judiciário de segunda instância,
instalada
na Bahia, com dez desembargadores, com a função de julgar recursos de agravo e
de apelação.
No Brasil Império, a Constituição de
1824, em seu artigo 158, também previu a existência das Relações nas
províncias, do que se depreende a continuidade da adoção de instâncias
múltiplas e verticalizadas para julgamento das demandas judiciais. Daí para
frente, todas as constituições brasileiras seguiram o mesmo modelo, com
alteração de órgãos, de nomes desses órgãos, mas sempre mantida a estrutura
verticalizada.
A
atual Constituição, em seu artigo 5°, inciso LV ("aos litigantes, em
processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o
contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes"), permite o entendimento de que o
direito de recorrer é inerente aos
princípios do contraditório e da ampla defesa. O recurso é, portanto, parte
integrante do processo, funcionando como uma modalidade do direito de ação (rectius como continuação do seu
exercício) exercido no segundo grau de jurisdição.
A esse respeito, aponta CORTES (CORTES,
2003, p. 25):
a) a competência recursal dos tribunais
está prevista constitucionalmente; acrescente-se aqui que a existência de um
segundo grau de jurisdição não pode reger um conjunto vazio;
b) o duplo grau de jurisdição seria um
consectário do princípio do devido processo legal;
c) o Brasil é signatário do pacto de
San José da Costa Rica, que prevê expressamente o duplo grau de jurisdição (em
seu artigo 8°, inciso II, alínea H) - ainda que somente na esfera penal.
No que concerne a esse princípio, vale
ressaltar que o entendimento comum da doutrina é o de que toda decisão judicial
deve poder ser submetida a novo exame, de modo que a segunda decisão prevaleça
sobre a primeira, tornando possível a correção de erros (MEDINA, 2002,
p.29-30). Isso não quer dizer, entretanto, que esteja vedado ao legislador
ordinário o estabelecimento de restrições ao direito de recorrer (PINTO, 2002,
p.28), dado que, o sistema constitucional brasileiro trabalha com princípios de
variados matizes (algumas vezes em concorrência, outras em colisão) que devem
ser aferidos em determinadas circunstâncias, ora prevalecendo uns, ora outros,
sem que se cogite de sua expulsão do ordenamento jurídico.
Por dever acadêmico, é imperioso
registrar que a admissão do duplo grau de jurisdição, como princípio imanente
ao devido processo legal, não goza de unanimidade. Orestes Nestor de Souza
Laspro[5], por exemplo, afirma que "duplo
grau de jurisdição é mecanismo adotado
sem maior reflexão, com base mais em aspectos histórico-políticos que
jurídicos. [...] Representa obstáculo à eficiência
da organização judiciária, na medida em que não se pode demonstrar
cientificamente, que atinja de modo eficaz a única meta para ser
mantido, qual seja, a de que a decisão de segundo grau é 'melhor' que a de
primeiro".
Ora,
não se quer abrir debate a esse respeito, mas parece razoável entender que as
instâncias recursais, pelo menos em tese, são compostas de julgadores mais
tarimbados, experimentados pelos anos de judicatura, desprovidos de arroubos
juvenis, que decidem de forma normalmente colegiada (embora, no direito
brasileiro, exista uma clara tendência para que os órgãos de segundo grau
passem a decidir, cada vez mais, de forma monocrática), o que faz lícito
esperar que as decisões de segundo grau espelhem um grau de acerto (justiça)
maior do que aquelas de primeiro grau.
Vale a anotação, de passagem, que não há
dúvidas, do ponto de vista exclusivamente doutrinário, de que não existe um
terceiro ou um quarto grau de jurisdição (embora a prática esteja a indicar
outra coisa). Há, sim, instâncias superiores ao segundo grau, normalmente
apelidadas de instâncias de superposição, a quem cabe o julgamento dos chamados
recursos excepcionais, mas o exame desses recursos (extraordinário e especial)
não visa precipuamente à proteção do direito de que cogita o recorrente ao
exercer sua pretensão; visa, isso sim, à proteção da lei federal (e da sua
unidade de aplicação) e da Constituição. Somente de forma consequencial (isto
é, como corolário da defesa do direito objetivo) é que esses recursos resguardam
o direito subjetivo do recorrente.
I.2 Conceito
Como já assinalado anteriormente, o
conceito de recurso não é algo que seja pacífico em doutrina. Há ,
entretanto, a possibilidade de indicar alguns pontos de contato entre as várias
tentativas, sendo sempre considerado, para os fins de nosso estudo, o
ordenamento positivo brasileiro.
O primeiro aspecto relevante é o fato de
os recursos fazerem parte de processo em curso, não constituindo, portanto,
outra relação processual independente. Nesse sentido, é também compreendido
como um apêndice, um complemento do procedimento da instância inferior (NERY Jr., 1993, p.49). Carnelutti o vê como um
procedimento endoprocessual (in: PINTO, 2002, p. 28). Em outras palavras, os
recursos são exercitáveis na mesma relação jurídica processual em que foi
proferida a sentença recorrida (NERY Jr., 1993, p. 35). Há, por certo, outras
formas de hostilizar uma decisão judicial, fora da relação jurídica processual
em que proferida. Essas formas, entretanto, não são consideradas, entre nós,
recurso.
É usual dizer que os recursos são
espécies do gênero remédio. A nós, repugna a utilização vocacionada à
farmacologia (até porque há direito de recorrer ainda que a sentença não esteja
doente, não possua nenhuma espécie de vício). A ciência jurídica trabalha com
outros institutos e outras categorias que são plenamente capazes de albergar os
recursos. Preferimos, por isso, dizer que o recurso tem caráter de ônus processual. É, pois, uma situação
jurídica ativa (como prelecionava Miguel Reale), no sentido de que se destina à satisfação de um interesse próprio, o que a
distingue de um dever, destinado à satisfação
de um interesse alheio. Sua não-realização tem como consequência a perda de
possível posição de vantagem no processo.
Os objetivos do recurso, (rectius, do recorrente, quando dele se
utiliza) são a invalidação, a reforma, a integração ou o esclarecimento de uma
decisão judicial. Para o Estado, os objetivos são a promoção da melhor, mais
sistemática e precisa aplicação da lei, velando pela integridade do ordenamento
jurídico.[6]
A teor do disposto no artigo 499 do
Código de Processo Civil, os recursos podem ser opostos/interpostos pelas
partes litigantes, pelo Ministério Publico ou por um terceiro. Somados esses
elementos é possível apresentar uma definição razoável: Recurso é o ônus processual que a lei coloca à
disposição das partes, do MP ou de um terceiro, para que, na mesma relação jurídica processua1, em continuidade ao exercício
do direito de ação, possam postular a anulação, a reforma, a integração ou o
esclarecimento de decisão judicial.
A rigor, são recorríveis todos os atos
jurisdicionais que caracterizem decisões interlocutórias ou sentenças/acórdãos
(desde que presentes, por óbvio os pressupostos exigidos em lei). Atos de mero
expediente, a princípio, por não expressarem juízo de valor, não ensejam o
aviamento de recurso. Sem embargo disso, se, sob a nominação de despachos,
despachos de mero expediente, atos de expediente, ou qualquer outra, se ocultar
pronunciamento judicial de conteúdo decisório, é possível a sua correção por
meio de recurso.
Como já vimos alhures, dos
meios processuais através dos quais se pode impugnar uma decisão judicial, os
recursos são apenas uma espécie, que somente cabem enquanto a decisão judicial
não transitou em julgado (aliás, uma das virtualidades do recurso é justamente
a de retardar a formação do trânsito em julgado). Quando se trata de decisão
transitada em julgado, o meio de impugnação deve ser procurado dentre as
chamadas ações impugnativas autônomas, ressalvado o caso da ação de mandado de
segurança que (desafortunadamente) embora seja uma forma impugnativa autônoma,
é dirigida contra decisão não transitada em julgado.
Entre essas formas impugnativas, temos a
ação rescisória, a ação anulatória de que trata o artigo 486 do Código de
Processo Civil, e o já mencionado mandado de segurança. Todos esses meios,
entretanto, dão ensejo ao surgimento de nova relação jurídico-processual.
I.3 Princípios Recursais
Praticamente todos os manuais de Teoria
Geral do Processo cuidam da divisão dos princípios relativos ao direito
processual civil em (i) princípios informativos; e (ii) princípios
fundamentais. Os princípios informativos são: lógico; jurídico; político; e
econômico. Já os princípios fundamentais norteiam-se por um viés mais
ideológico, seguindo a orientação do sistema jurídico a que esteja vinculado o
direito recursal, e trazem em decorrência disso, grande fonte de discussão
doutrinaria, da qual, procuraremos nos afastar.
Cingimo-nos,
aqui, à analise desses princípios
fundamentais, aplicáveis aos recursos no atual ordenamento jurídico brasileiro,
seguindo a trilha aberta pelo Professor Nélson Nery Junior.
I.3.1 Princípio do duplo grau de jurisdição
Já a ele fizemos menção em momento
anterior. É necessário, entretanto, trazer outras achegas. Vale dizer, nesse
sentido, que a Constituição de 1824 já o previa, ilimitadamente, de modo claro
e irrestrito, no seu artigo 158:
"Para julgar as causas em segunda
e última instância haverá nas Províncias do Império as Relações, que forem
necessárias para a comodidade dos povos".
Apesar disso, sempre se entendeu que os
textos constitucionais (esse e os subsequentes) permitiam a imposição de
limites à aplicação desse princípio, por meio de normas infraconstitucionais,
como se percebe, por exemplo, do exame do Regulamento 737, de 25.11.1850, onde
o cabimento do recurso estaria ligado ao valor da causa.
É verdade, também, que o princípio do
duplo grau de jurisdição não se encontra expressamente indicado na Constituição
de 1988, mas está diretamente relacionado com o princípio do devido processo
legal, presente no artigo 5°, LIV: "ninguém será privado da liberdade ou
de seus bens sem o devido processo legal"; e também encontra respaldo no
fato de que se atribuiu aos órgãos do Poder Judiciário, competência recursal
ordinária.
Este princípio, claramente, se relaciona
com a vontade do constituinte de evitar abusos de poder por parte do juiz, dado
que o juiz único poderia tornar-se despótico, e de sua decisão não caberia
recurso ou reclamação. Assim, o ordenamento brasileiro, a exemplo de outros
ordenamentos jurídicos, previu que a decisão emanada do juiz estivesse sujeita
a revisão por outro órgão do Poder Judiciário.
I.3.2 Princípio da taxatividade
O principio da taxatividade recursal
implica que só se considera recurso aquele que se encontra previsto em lei
federal e que somente por lei federal pode ser criado. Na seara do direito
processual civil, além de eventuais recursos criados por lei federal
extravagante, os recursos estão enumerados no artigo 496, in verbis:
Artigo 496. São cabíveis os seguintes
recursos:
I - apelação;
II- agravo;
III - embargos infringentes;
IV - embargos de dec1aração;
V - recurso ordinario;
VI - recurso especial;
VII - recurso extraordinário;
VIII - embargos de divergência em
recurso especial e em recurso extraordinário.
Este
artigo constitui a referência da presença da taxatividade do sistema recursal.
Deveras, no caput, o legislador
utilizou o termo "seguintes" para designar os recursos que seriam
cabíveis. Em outras palavras, pode-se afirmar que somente os meios de
impugnação ali descritos serão considerados pela lei como sendo recursos.
Confirma NELSON NERY JUNIOR que: "Este artigo é correspondente à síntese de todo o sistema recursal no
processo civil brasileiro, relativamente à previsão
e cabimento dos recursos" (NERY Jf. 1993. pp. 46).
Adicionalmente,
é necessário ter em conta que, pelo princípio da taxatividade, considera-se
vedada a criação de outros recursos, seja por leis estaduais, seja por
Regimentos Internos de Tribunais, que, aliás, têm o vezo de legislar em matéria
processual.
À
falta de previsão legal, não são considerados recursos (embora sejam
considerados como sucedâneos de recursais): (i) o pedido de reconsideração, que
não suspende, nem interrompe o prazo para interposição de verdadeiros recursos;
(ii) a correição parcial; (iv) a remessa obrigatória ou reexame necessário,
previsto no artigo 475, não é recurso, mas elemento indispensável e integrativo
da sentença[7] que somente se formará e terá aptidão
para transitar em julgado após o exame pelo tribunal de segundo grau; (iv) a
ação rescisória (artigo 485); (v) os embargos de terceiro (artigo 1.046); (vi)
a medida cautelar inominada (arts. 798 e 799), ainda que aviada para tentar
conferir efeito suspensivo a recurso; (vii) os agravos exclusivamente
regimentais; (viii) o mandado de segurança contra ato judicial.
I.3.3 Princípio da Singularidade
Segundo
o principio da singularidade (também chamado princípio da unirrecorribilidade),
para cada ato judicial recorrível há um único recurso previsto pelo
ordenamento, sendo vedada a interposição cumulativa ou simultânea de mais outro
visando à impugnação da mesma sentença ou acórdão. Isso não significa que não
possam as partes interpor cada uma um recurso da mesma decisão, na hipótese de
haver sucumbência recíproca.
O
Código Buzaid, procurou definir, no artigo 162, os atos decisórios do juiz.
Após, em outros momentos, estabeleceu o cabimento de determinado recurso para
cada um esses atos, numa espécie de correspondência biunívoca, acolhendo,
assim, este principio da singularidade.
Não
se confundem o princípio da taxatividade, que elenca o rol dos recursos
disponíveis, e o princípio da singularidade, que exerce a adequação entre o que
está previsto e o que é, de fato,
cabível. Apesar de as expressões cabimento e adequação serem similares, não são
sinônimas. Por cabimento temos de entender a previsão de recorribilidade de
determinada espécie de decisão judicial. Por adequação, a previsão legal que
re1aciona a decisão eventualmente desfavorável e o recurso já previsto na
legislação de regência.
Vezes
há em que se indica, em sede de doutrina, exceções a esse princípio, por
exemplo, dizendo que uma mesma decisão desafia embargos de declaração e recurso
de apelação (ou outro recurso qualquer); ou que um acórdão pode ser atacado por
embargos infringentes, recurso especial e recurso extraordinário. Se se atentar
bem, entretanto, ver-se-á que não se trata de verdadeiras exceções, por
diferentes razões. Na primeira hipótese, os embargos de declaração (que, num
exame puramente lógico conceitual não caberiam no conceito de recurso) são
tirados e somente após a prolação da nova decisão, de caráter integrativo, é
que seria possível a interposição da apelação. Não pode, entretanto, a mesma
parte, ao mesmo tempo, opor embargos e interpor recurso de apelação. Na segunda
hipótese, é necessário verificar que, se couberem embargos infringentes e
recursos especial e extraordinário é porque houve, no acórdão que reformou a
decisão de primeiro grau ou julgou procedente a ação rescisória, partes
decididas de forma unânime e outras decididas de forma não-unânime. Em outras
palavras, embora a decisão seja formalmente una, terá ocorrido o julgamento de
mais de uma lide, a que correspondem os vários capítulos da decisão. No mesmo
sentido, veja-se Araken de Assis (1999, p. 16) e Barbosa Moreira (2001, p.
249).
No
que concerne à simultaneidade do recurso extraordinário e especial, o nosso
entendimento de que não está excepcionado o princípio da singularidade funda-se
em que cremos que esses dois são, na verdade, um único e mesmo recurso extraordinário,
julgado em dois momentos distintos, por dois diferentes órgãos do Judiciário,
em decorrência de uma divisão de competência funcional (i.e. atribuição de
competência a mais de um órgão da jurisdição para atuar num mesmo processo),
fixada em razão da matéria.
1.3.4 Princípio da Fungibilidade
Este
princípio, de inegável utilidade prática, não foi albergado expressamente pelo
atual Código de Processo Civil, diferentemente do tratamento que lhe dispensou
o Código de 1939, que em seu artigo 810 previa esta possibilidade.
"Artigo 810. Salvo hipótese de
má-fé ou erro grosseiro, a parte não será prejudicada pela interposição de um
recurso por outro, devendo os autos ser enviados à Câmara, ou turma, a que competir o julgamento".
O
legislador de 1973 entendeu que, ao simplificar o sistema recursal, não haveria
necessidade de manter um princípio que permitiria o recebimento de recurso
inadequado, dado que não ocorreriam mais dúvidas, e que, se tivesse havido a
interposição de um recurso por outro, a hipótese deveria, obrigatoriamente, ser
de má-fé ou de erro grosseiro. Depois de certo tempo de vigência do novo
código, percebeu-se que a suposta simplificação não fora tão eficiente
assim e que remanesciam hipóteses de dúvida objetiva quanto ao recurso que
deveria ser interposto. Assim, a doutrina e a jurisprudência, passaram a
admitir a continuidade da aplicação do princípio da fungibilidade, a fim de não
prejudicar o recorrente.
A
hipótese é, pois, de interposição incorreta de recurso, ou seja, ao recorrer de
determinado ato judicial, a parte interpõe recurso diverso do que deveria ser
usado para o caso específico, o que, a rigor da lei, implicaria o
não-conhecimento da peça de irresignação porque, já se viu, não basta o
interesse do legitimado em impugnar o ato decisório, mas é preciso que o
recurso utilizado seja o adequado para a espécie. Incidindo o princípio da
fungibilidade, é possível o aproveitamento desse recurso, que será examinado
como se interposto corretamente. Neste mesmo sentido, NELSON NERY JUNIOR define
o principio como aquele pelo qual se permite a troca de um recurso por outro: o
tribunal pode conhecer do recurso erroneamente interposto. (NERY Jr. 1993. pp.
690-691).
Esse
princípio tem íntima conexão com o da instrumentalidade das formas, acolhido no
código de processo civil, por meio do qual é possível entender que o que se
deve visar na moderna técnica processual é a finalidade dos atos e não apenas
formalismos, isto é, o culto da forma pela forma, os quais podem não refletir o
uso coerente do direito e desatender os fins a que ele se destina.
Na
vertente de1939, o princípio de fungibilidade, exigia duas condições negativas
para a sua aplicação: o erro grosseiro e a má-fé. O erro grosseiro poderia ser
aferido, por exemplo, quando houvesse disposição expressa e induvidosa de lei
dizendo qual o recurso cabível, sem que houvesse dissenso sério na doutrina e
jurisprudência quanto ao tema. A má-fé seria aferível pelo emprego de recurso
cujo prazo de interposição fosse superior ao do recurso realmente cabível, como
forma de contornar eventual perda de prazo.
Frente
a isso, hoje em dia, a doutrina moderna criou alguns requisitos para permitir a
aplicação do princípio da fungibilidade: o primeiro requisito, já mencionado
anteriormente, é a existência de dúvida objetiva sobre qual o recurso correto a
ser interposto, dúvida essa que pode se verificar quando: (i) o código de
processo civil designa uma decisão interlocutória como sentença ou vice-versa,
contrariando a própria definição legal; (ii) a doutrina e/ou a jurisprudência
divergem quanto à classificação de
determinados atos judiciais e, consequentemente, quanto ao recurso adequado;
(iii) o juiz profere um pronunciamento em lugar de outro. A dúvida objetiva não
alberga inseguranças pessoais dos patronos das partes, ou deficiências de
natureza técnica. Dizendo de outro modo, se o recurso adequado estiver expresso
em lei e se a decisão proferida for compatível com a sua previsão legal, não há
dúvida objetiva. Se interposto outro recurso no lugar do que deveria ter sido,
o que há é o desconhecimento do texto legal.
1.3.5 Princípio da Dialeticidade
O
princípio da dialeticidade impõe a necessidade de que o recurso esteja
devidamente fundamentado, não bastando, somente, para que o recurso seja
apreciado, a existência de manifestação da parte dizendo que deseja recorrer.
Em outras palavras, o recorrente deve dar as razões pelas quais entende
necessário o reexame da decisão. Somente assim a parte contrária poderá ofertar
as suas razões, defendendo o ato impugnado, atendendo ao contraditório em sede
recursal. O recurso deve conter os fundamentos de fato e de direito que embasam
a irresignação recorrente, assim como o pedido de nova decisão.
A
exigência de motivação, que consubstancia o princípio da dialeticidade encontra
respaldo no Código de Processo Civil, especificamente para os diversos tipos de
recurso, a saber: para a apelação (artigo 514, II e III); para o agravo (artigo
524 e 525); no caso do agravo retido (artigo 523, § 3°); para os embargos de
declaração (artigo 536); para o recurso ordinário (artigo 540); e para os
recursos especial e extraordinário (artigo 541).
É importante ressaltar que a ausência da
apresentação das razões do recurso acarreta o seu não conhecimento, sendo caso
de inépcia recursal (cf. NERY JR. 1993. pp. 146).
1.3.6 Princípio da Voluntariedade
O recurso, no que concerne ao seu
conteúdo, se compõe de duas partes distintas: a declaração expressa sobre a
insatisfação com a decisão proferida (e o correspondente pedido de reforma),
conhecida como elemento volitivo; e os motivos que geraram essa insatisfação,
que seriam o elemento de razão ou descritivo. Assim, o recurso interposto sem o
conhecimento e vontade da parte não pode ser conhecido (NERY Jr. 1993. pp.
149). Exemplifica o mesmo Nelson Nery Junior que uma manifestação desse
princípio seria o não-conhecimento do recurso em decorrência da verificação de
fato impeditivo ou extintivo do poder de recorrer, tal como a renúncia ou a
desistência do recurso. Faltaria, portanto, a vontade inequívoca de recorrer. O
que se pretende, em resumo, e garantir a lisura de uma decisão excepcional e de
relevante repercussão para a sociedade, extravasando interesses das próprias
partes.
1.3.7 Princípio da irrecorribilidade em
separado das interlocutórias
Por
este princípio (que encontra maior abrigo no Direito do Trabalho), entende-se
que, a bem da celeridade processual (a razoável duração do processo de que fala
a Constituição), as decisões interlocutórias não devem ser impugnadas de forma
independente.
É
claro que a adoção desse princípio varia de ordenamento para ordenamento e de
um momento histórico para o outro. Com o advento do Código de 1973, todas as
decisões interlocutórias passaram a ser atacáveis via agravo de
instrumento. Isso, entretanto, não
vulnerava a marcha do processo justamente porque esse recurso não era dotado de
efeito suspensivo, a não ser naquelas hipóteses em que coubesse a aplicação do artigo
558 do CPC. Hoje em dia, há uma tendência, no direito brasileiro, bastante
forte para colocar o agravo de instrumento numa espécie de limbo jurídico,
substituindo-o pelo agravo retido (mal comparando, uma espécie de protesto na
justiça do trabalho cujo objetivo é impedir a ocorrência da preclusão). Em
Portugal, desde o início de 2008, já se encontra em vigor a nova sistemática
recursal que, para os processos novos, não mais cabem falar em recurso de
agravo, em integral acatamento do princípio sob estudo.
1.3.8 Princípio da Complementariedade
No
direito processual civil não se admite a interposição do recurso, em
determinado momento, e a posterior dedução das razões que o fundamentam em outro. Dizendo de
outra maneira, os recursos devem ser interpostos no prazo previsto na lei,
juntamente com as razões do inconformismo, dando-se de logo a chamada prec1usão
consumativa. Se não foram aduzidas razões ou o foram de forma incompleta, nada
mais poderá fazer o recorrente a esse respeito. O princípio da
complementariedade excepcionaria esse entendimento (é, pois, uma exceção e não
um princípio).
Para NELSON NERY JUNIOR:
"Pelo princípio da complementaridade, o recorrente poderá complementar a
fundamentação de seu recurso já interposto, se houver alteração ou integração
da decisão, em virtude de acolhimento de embargos de dec1aração" (NERY Jr.
1993. pp. 152). Em outras palavras, a única hipótese que se visualiza de
complementaridade diz respeito aos casos em que, tendo havido sucumbência
recíproca, a decisão atacada é alterada supervenientemente à interposição de recurso por uma das partes:
é o caso, por exemplo, de alteração do decisório em embargos de dec1aração, já
tendo outra parte interposto recurso de apelação. Terá direito, portanto, de
completá-la.
1.3.9 Princípio da Proibição da Reformatio in Pejus
A
expressão reformatio in pejus designa a reforma da decisão judicial, em
prejuízo para o recorrente. Ocorrência desse jaez não se compadece com o
ordenamento processual civil. Objetiva-se, com a adoção do princípio, evitar
que o tribunal destinatário do recurso possa decidir de maneira agravar a
situação do recorrente, ultrapassando o âmbito de devolutividade fixado com a
interposição do recurso; desde que, por óbvio, não tenha havido recurso da
parte contrária.
Assim
deve ser em respeito ao efeito devolutivo restrito na própria peça recursal.
Não pode o tribunal ir além dos limites fixados no pedido recursal,
prejudicando quem recorre.
Cabe
uma anotação lateral. A rigor não se poderia falar de proibição de reformatio in pejus nas hipóteses relativas
à remessa obrigatória de que trata o artigo 475 do CPC, quando por outro motivo
não fosse, em decorrência do fato de que remessa obrigatória não é recurso. Sem
embargo disso, a jurisprudência vem se fixando em sentido contrário ao aqui
sustentado, já havendo súmula do STJ (Súmula nº 45) asseverando que é defeso ao
judiciário, no reexame necessário, agravar a condenação imposta à fazenda
pública.
Os requisitos dos recursos são os elementos
que hão de estar presentes no recurso para que este possa ser aprovado no exame
preliminar da sua admissibilidade. Hão de ser preenchidos para que ó órgão
julgador do recurso possa analisar-lhe o mérito. Bernardo Pimentel Souza (2000,
p. 46-47) lembra que no Código de Processo Civil brasileiro são usados ambos os
termos indicados na epígrafe sem explicitação de diferenças, quais sejam:
requisitos (ex. artigo 540, caput) e pressupostos (ex. artigo 518,
parágrafo único), sendo eles, portanto, para o legislador processual,
equivalentes.
Araken
de Assis (1999, p. 13) lembra sua natureza de ordem pública, devendo ser
examinados de ofício e a qualquer tempo pelo órgão julgador. Se não forem os
mesmos o órgão perante o qual se interpõe o recurso e o órgão que deverá
julgá-lo, haverá dois juízos acerca da admissibilidade recursal, sendo o
primeiro, exercido pelo juízo a quo, de natureza provisória e não-vinculante. Deve ser explícito e
fundamentado, sendo lícito ao órgão ad quem fazê-lo de forma implícita
apenas se o seu conteúdo for positivo. Do recurso em que presentes todos os
requisitos, diz-se conhecido; do recurso cujo exame de mérito foi obstado pela
ausência de qualquer deles, diz-se não conhecido.
Classificam-se
os pressupostos de admissibilidade em intrínsecos e extrínsecos. Segundo
Barbosa Moreira, os primeiros dizem respeito à própria existência do poder de
recorrer (2001, p. 262) e são o cabimento, a legitimidade, o interesse e a
inexistência de fato impeditivo ou extintivo do direito de recorrer. Quanto aos
últimos, ligam-se ao modo de exercer esse direito e são a tempestividade, a
regularidade formal e o preparo. Nelson Nery Jr., embora concorde com essa
forma de c1assificar, define os requisitos intrínsecos como os que "dizem
respeito à decisão recorrida em si
mesma considerada" (1997, p. 238), sendo eles o cabimento, a legitimidade
e o interesse, e os requisitos extrínsecos como fatores extemos à decisão atacada, estando aí inc1uídos a
tempestividade, a regularidade formal, o preparo e a inexistência de fato
impeditivo ou extintivo.
Além
desses requisitos, podem existir outros, exigidos especificamente para
determinados recursos, como o prequestionamento para os recursos especial e
extraordinário. É possível que alguns desses requisitos não sejam exigíveis em
relação determinado recurso ou em relação a algum recorrente, como o preparo
que é dispensado no agravo retido, nos embargos de dec1aração (seja quem for o
recorrente) e para a Fazenda Publica (seja qual for o recurso).
1.4.1 Cabimento
Nelson
Nery Jr. (1997, p. 239-240) ensina, na esteira da doutrina consagrada, que o
cabimento do recurso diz respeito ao binômio recorribilidade-adequação, ou
seja, um recurso ser cabível significa que a decisão atacada é tida por
recorrível no sistema jurídico e, ainda, que o recurso aviado é aquele previsto
in abstracto como apto à provocação da sua modificação. Exemplifica
apontando que a sentença é tida por decisão recorrível, cujo recurso adequado,
segundo o CPC, é a apelação.
São
irrecorríveis no sistema jurídico brasileiro os despachos de mero expediente.
Contra os demais atos do juiz (ou do órgão julgador), estão previstos no artigo
496 do CPC, em rol taxativo (ASSIS, 1999, p. 19): apelação, agravo, embargos
infringentes, embargos de dec1aração, recurso ordinário, recurso especial,
recurso extraordinário e embargos de divergência.
A
apelação é o recurso cabível contra a sentença, quer se trate de sentença
meramente processual, quer se trate de sentença que haja resolvido o mérito. Bernardo
Pimentel Souza aponta três exceções ao cabimento de apelação de sentença: a
primeira consta do artigo 105, inciso II, alínea 'c', da Constituição Federal,
e do artigo 539, inciso II, alínea 'b', do Código de Processo Civil. Da
sentença proferida em causa internacional cabe recurso ordinário para o
Superior Tribunal de Justiça; a segunda exceção esta prevista no artigo 34 da
Lei n. 6.830/80. Com efeito, cabem embargos infringentes de alçada contra
sentença proferida em ação regulada pela Lei n. 6.830/80, e com valor da causa
inferior ou igual ao teto legal; a última exceção ao binômio sentença-apelação
consta do artigo 41 da Lei n. 9.099/85. Realmente, da sentença proferida em
ação submetida ao rito da Lei n. 9.099/95 cabe recurso inominado - e não apelação.
(SOUZA; 2000, p. 48).
O
agravo a que se refere o artigo 496 do CPC é gênero do qual são espécies o
agravo de instrumento, o agravo retido e o agravo interno, além do agravo de
instrumento contra decisão de inadmissão de recurso especial ou extraordinário.
Os arts. 522 e seguintes do Código de Processo tratam dos agravos, retido e de
instrumento, contra decisão interlocutória proferida no primeiro grau de
jurisdição. O agravo de instrumento do artigo 544, por sua vez, é o recurso
cabível contra inadmissão de recurso especial ou extraordinário.
O artigo
557, § 1°, do mesmo diploma legal trata do agravo interno, cabível contra
decisão (monocrática) de relator em Tribunal.
Os
embargos infringentes estão regulados pelo artigo 530 do CPC brasileiro e são
cabíveis quando decisão colegiada não-unânime tiver julgado procedente ação
rescisória ou, em apelação, tiver reformado a decisão de primeiro grau. A
jurisprudência do STJ entende não serem cabíveis os embargos infringentes
quando o dissenso ficar restrito a questão decidida em embargos de dec1aração
(por exemplo, a aplicação da multa prevista no artigo 538 do CPC), ao argumento
de que essa parte da decisão dos embargos de dec1aração não apresenta o efeito
integrativo (como é normal nos embargos dec1aratórios) do acórdão da apelação.
Os
embargos de dec1aração são oponíveis, tanto de sentença quanto de acórdão, bem
como de qualquer decisão interlocutória, desde que omissos, obscuros ou
contraditórios. Esses são requisitos específicos dos embargos de dec1aração,
como já se apontou ser possível existir.
Cabe
recurso ordinário, nos termos do artigo 539 do CPC e também dos arts. 102, II,
'a', e 105, II, 'b', da Constituição Federal, para o Supremo Tribunal Federal
ou para o Superior Tribunal de Justiça, respectivamente, de habeas corpus, mandado de segurança, habeas data e mandado de injunção
decididos em única instância pelos Tribunais Superiores, quando denegatória a
decisão e crime político; ou habeas
corpus e mandado de segurança denegados em última ou única instância pelos
tribunais federais ou estaduais, alem das causas envolvendo de um lado, Estado
estrangeiro ou organismo internacional, e, de outro, Município ou pessoa
residente ou domiciliada no Brasil.
Os
recursos especial e extraordinário são cabíveis quando a decisão recorrida
afrontar a lei federal ou a Constituição, sendo julgados, respectivamente, pelo
STJ ou pelo STF, e regulados na Constituição, nos artigos 102, III, e
105, III, e também no CPC, na Seção II do Capitulo VI do Titulo X do
primeiro livro. Quanto ao cabimento, há varias especificidades, como por
exemplo, na hipótese de interposição do recurso especial com base na alínea
"c" do supracitado artigo 105, III, da CF, a divergência
jurisprudencial há de ter ocorrido entre tribunais diversos, ao teor da Súmula
13 do STJ.
Finalmente,
quanto ao tema cabimento, os embargos de divergência são o recurso cabível
contra acórdão, unânime ou não, proferido em recurso especial ou
extraordinário, nas hipóteses do artigo 546 do Código de Processo, ou seja, de
divergência de entendimento entre turmas, entre turma e seção, ou entre
qualquer destas e o órgão especial, no primeiro caso, e entre turmas ou entre
turma e plenário, no ultimo caso. Assim sendo, não cabem embargos de divergência
se uma turma do STJ decidiu questão federal em desacordo com o que foi decidido
em outra oportunidade pela mesma turma ou contra decisão monocrática do
relator, ou ainda contra acórdão em agravo regimental em agravo de instrumento,
exceto se neste acórdão a turma examinar o próprio mérito do recurso especial.
1.4.2 Legitimidade
Bernardo
Pimentel Souza (2000, p, 49) ensina que legitimidade recursal é o requisito que
se traduz na exigência de que recurso seja interposto por quem tem o poder de
recorrer, por força de lei. Nos termos do artigo 499, caput, do CPC, são
legitimados: a parte vencida, o Ministério Público e os terceiros prejudicados.
Quanto à parte, alerta Araken de Assis
(1999, p. 23) que é irrelevante a sua ilegitimidade para a causa, podendo ser
exatamente este o objeto do recurso.
Os
sucessores a título universal ou singular, em decorrência de fato posterior à decisão (se a sucessão se deu por fato
anterior à decisão impugnada, não há
dúvida, sendo certo que, neste momento, ja figuraria como parte o sucessor),
sem devolução do prazo, exceto se por causa mortis se deu a sucessão
(MOREIRA, 2001, p. 291), sendo necessário o procedimento de habilitação de que
cogita o artigo 1055 do Código de Processo Civil. Os assistentes também podem
recorrer, salvo se o assistido desistir da ação, reconhecer a procedência do
pedido ou transigir, nos termos do artigo 53 do Código.
Quanto aos terceiros intervenientes
(opoente, nomeado, denunciado chamado), são partes, desde o momento em que
passaram a integrar a relação processual, não havendo nenhuma peculiaridade em
relação a eles. Recorrem como qualquer outro que tenha legitimidade recursal.
A
legitimidade do Ministério Público é diferenciada, já que ele pode recorrer,
tanto na condição de parte (e aí, também, não há nenhuma especificidade),
quanto como fiscal da lei, sendo que, nesse ultimo caso, cabe esclarecer que o
processamento do recurso ministerial não fica condicionado à existência de recurso da parte (tal como
explicitado pela Sumula nº 99 do STJ), diferentemente do que ocorria no regime
do CPC de 1939, em que a questão suscitava dúvidas (MOREIRA, 2001, p.295).
O terceiro somente terá legitimidade,
nos termos do artigo 499, se tiver sido prejudicado pe1a decisão recorrida, ou
seja, o recurso interposto pelo terceiro dependerá do cumprimento de um
requisito extra, qual seja a demonstração do nexo de interdependência entre o
seu interesse de intervir e a relação jurídica submetida ao exame judicial (artigo
499, § 1°). Assim, não é qualquer
terceiro legitimado para recorrer no ordenamento brasileiro. Somente o terceiro
que ostente a condição de prejudicado, atingido pela decisão impugnada, poderá
fazê-lo.
Quanto
à legitimidade do terceiro prejudicado
e do Ministério Público (na qualidade de fiscal da lei) cabe uma última
ressalva: não são legitimados a recorrer adesivamente, dada a expressão dicção
do artigo 500 do CPC, segundo o qual, sendo vencidos 'autor e réu', ao recurso
por qualquer deles interposto e permitido aderir 'a outra parte'. Em posição
diversa da aqui sustentada está Nelson Nery Junior (1997, p. 258), que se
mostra favorável à existência, nesse caso, da legitimidade do Ministério
Público, ao argumento de que o termo parte do artigo 500 deve ser interpretado
em sentido lato.
Pensamos, por outro lado, que há
legitimidade do Advogado para recorrer, com relação à parte da decisão relativa
à fixação dos honorários de sucumbência, já havendo algumas manifestações dos
tribunais nesse sentido.
1.4.3 Interesse
O
interesse em recorrer estará configurado sempre que se puder demonstrar (i) a
utilidade do recurso, ou seja, a possibilidade de que a decisão do recurso
outorgue ao recorrente uma situação mais favorável do que aquela que ostenta
antes do julgamento do recurso, e (ii) a sua necessidade, consistente na
impossibilidade de se alcançar aquela utilidade por outro meio menos gravoso.
Quanto
à utilidade do recurso, Barbosa Moreira explica que o termo parte vencida, a
quem a lei confere o direito de recorrer, deve ser bem entendido:
E vencida a parte, sem dúvida, quando a decisão
lhe tenha causado prejuízo, ou a tenha posto em situação menos favorável do que
a de que ela gozava antes do processo, ou lhe haja repelido alguma pretensão,
ou acolhido a pretensão do adversário. Mas também se considera vencida a
parte quando a decisão não lhe tenha proporcionado, pelo prisma prático, tudo
que ela poderia esperar, pressuposta a existência do feito (MOREIRA, 2001,
p. 299).
Como
se trata de vantagem prática, convém deixar marcado que há interesse da parte
ré, no caso de improcedência de ação popular ou ação civil pública por falta de
provas, de recorrer para demonstrar que
nenhum fato narrado ou provado poderá conduzir à procedência do pedido,
visando, com o recurso, a impedir que outra ação com a mesma pretensão de
direito material possa ser exercida. Há
também interesse recursal quando o autor, diante de sentença ultra ou extra
petita, recorre com a finalidade de afastar a nulidade do julgado (NERY
JUNIOR, 1997, p. 274). Haverá, de modo contrário, falta de interesse recursal,
por inutilidade, no agravo retido contra decisão que determinou indevidamente a
suspensão do processo, ou que indeferiu pedido de julgamento antecipado da
lide, já que, no momento da apreciação do agravo retido já terá sido prolatada
sentença, restando prejudicado o mérito do agravo retido (NERY JUNIOR, 1997, p.
279).
1.4.4
Fatos extintivos e impeditivos
A
doutrina não se acerta quanto ao que, em termos de teoria dos recursos, é fato
extintivo e quanto ao que é fato impeditivo do direito de recorrer. Tem sido
sustentado que fatos extintivos do direito de recorrer são a renúncia ao
recurso e a aceitação ou aquiescência da decisão; fatos impeditivos desse
direito são a desistência do recurso, reconhecimento da procedência do pedido,
a renúncia ao direito sobre o qual se funda a ação, a ausência do depósito de
multa processual e a prática de ato contrário à vontade de recorrer, causando a prec1usão lógica (SOUZA, 2000, p.
56). Nelson Nery Junior (1997, p. 329) conc1ui que "do ponto de vista
prático, a presença de qualquer deles no processo faz com que o recurso seja
inadmissível, não conhecível".
A
renúncia pressupõe a existência da decisão desfavorável, consistindo em
manifestação de vontade de não recorrer, previa à interposição do recurso. Em
nosso entender, a renúncia há de ser expressa. Em sentido contrário, admitindo
a renúncia tácita, há o posicionamento de Barbosa Moreira (2001, p. 340), para
quem esta consistiria na pratica de ato incompatível com o desejo de recorrer,
desde que praticado sem reserva. Admitindo a renúncia prévia, e ressaltando
dever ser expressa (neste caso), posiciona-se Nelson Nery Junior (1997, p.
330-350).
Consectário
da renúncia é a inadmissibilidade do recurso interposto em desconformidade com
o direito manifestado. Não influi no direito dos litisconsortes recorrerem,
tampouco depende da aquiescência desses ou da outra parte (artigo 502 do CPC).
A
desistência (artigo 501 do CPC) pressupõe, mais do acontece na renúncia, tanto
a existência da decisão desfavorável quanto a interposição do recurso,
sendo-lhe posterior e podendo ser total ou parcial (MOREIRA, 2001, p. 330).
Pode o recorrente desistir do recurso até o seu julgamento (inclusive
oralmente, por ocasião da sessão de julgamento), fazendo com que se tome
inexistente (não inadmissível), não podendo ser conhecido. Não depende da
manifestação de vontade da parte contrária ou dos litisconsortes do desistente,
mas requer poderes especiais por parte do advogado (SOUZA, 2000, p. 58).
Tampouco está impedido, o desistente de recurso autônomo, no caso de
sucumbência recíproca, de recorrer adesivamente (NERY J1.JNIOR, 1997, p. 357;
MOREIRA, 2001, p. 335).
Vale o registro de que, recentemente, o
STJ não acolheu a desistência de um recurso que havia sido selecionado pra
julgamento na forma do artigo 543-C, do Código de Processo Civil (Recurso
Repetitivo).
A
aquiescência (prevista no artigo 503 do CPC) é a manifestação de aceitação do
julgado, podendo ser total ou parcial, expressa ou tácita (desde que
inequívoca). Deve ser espontânea, ou seja, antes que o julgado comece a
produzir efeitos quanto ao aquiescente, e pode ser manifestada tanto antes
quanto depois da interposição do recurso, inclusive pelo terceiro prejudicado a
quem a lei processual confere legitimidade recursal (MOREIRA, 2001, p.
345-347). Como a desistência, tem o condão de provocar o imediato trânsito em
julgado da decisão aceita, a não ser que esse seja obstado por outro motivo.
1.4.5 Tempestividade
A
tempestividade e a exigência, vinculada
ao princípio da preclusão que orna o direito processual civil, de que o recurso
seja interposto no prazo previsto em lei, a fim de que a prestação
jurisdicional se dê num tempo razoável, em prestígio de sua efetividade.
Os
prazos recursais são de quinze dias, nos termos da redação do artigo 508 do
CPC, para a apelação, os embargos infringentes e os de divergência, bem como
para os recursos especial e extraordinário. Excetuam-se a essa regra os embargos
de dec1aração, que devem ser aviados em cinco dias, seja qual for o tipo de
decisão recorrida, e o agravo interposto contra decisão interlocutória
proferida no primeiro grau (artigo 522) ou contra inadmissão de recurso
especial ou extraordinário que devem ser protocolizados em dez dias e, se
interno (contra decisão de relator em tribunal), o prazo é de cinco dias. Há, ainda, as especificidades
estabelecidas em leis especiais, como o prazo de dez dias para o recurso
inominado da Lei n° 9.099/95 (artigo 42) e para os embargos infringentes de
alçada, como consta do artigo 34 da Lei nº 6.830/80.
Os prazos processuais são de natureza
peremptória e improrrogáveis. Pode, entretanto, o juiz, devolver o prazo a
parte que deixou de aviar o recurso por justa causa (artigo 183).
Além
das hipóteses de suspensão, há considerar as de interrupção, que atribuem ao
interessado um novo prazo, por inteiro. Tanto a suspensão como a interrupção do
prazo devem ser contadas a partir da ocorrência do fato qualificado pela lei
como causa destes eventos a despeito de poder ser outro o momento da ciência do
juízo acerca da sua ocorrência. Já o reinício da fluência do prazo somente se
dá com a intimação dos advogados das
partes, não podendo ser praticado qualquer ato processual durante a suspensão
ou interrupção.
A
data a ser considerada para efeito de aferição da tempestividade recursal é a
do protocolo da petição no cartório ou secretaria do tribunal (artigo 506,
parágrafo único, primeira parte), como regra geral. As exceções (SOUZA, 2000,
p. 72-74) ficam por conta do agravo de instrumento previsto no artigo 522 —
cuja tempestividade também pode ser comprovada pelo carimbo de postagem nos
correios (artigo 525, § 2°), se esta for a forma de protocolo escolhida pelo
recorrente —; nos locais em que tenha sido instituído o protocolo integrado
pela lei de organização judiciária, em que a petição pode ser protocolizada em
qualquer cartório, sendo posteriormente remetida ao cartório competente (com a
tempestividade aferida da entrada da petição no primeiro cartório); e, por fim,
com a possibilidade do protocolo via fac-simile, prevista na Lei n° 9.800/99,
que prevê uma aferição dupla da tempestividade: o envio do fax deve ser feito
dentro do prazo e o protocolo da petição original em cinco dias. Vale um
esclarecimento sobre a protocolização da petição original: segundo entendimento
prevalecente, não se trata de um novo prazo e sim da extensão do prazo
original. Sem embargo da controvérsia doutrinária que poderia e pode ser
estabelecida a esse respeito, hão de precatar-se os profissionais da advocacia
nessa contagem. Assim, por exemplo, se o prazo original vence numa sexta-feira,
e nessa é realizado o envio do fax, os cinco dias para protocolização do
original compreendem o sábado e o domingo imediatamente seguintes, com o que o
prazo adicional vence na quarta-feira e não na sexta, como seria de supor se
utilizássemos a regra geral da contagem dos prazos.
1.4.6 Regularidade formal
A
regularidade formal é o pressuposto de admissibilidade recursal que concerne àt necessidade de que recurso seja interposto
na forma prevista em lei. Em
regra, os atos processuais não necessitam atender a forma predeterminada;
entretanto, os recursos além de ter a forma escrita (ressalvadas hipóteses excepcionais
nas quais se exige a forma oral, e.g., agravo retido tirado em audiência de
instrução e julgamento), não sendo admitido recurso por aposição de cota nos
autos (SOUZA, 2000, p. 79). Exigência conexa a esta, e específica dos recursos
interpostos por fax, é que o original seja protocolizado no prazo legal,
devendo a petição ser idêntica àquela transmitida.
A
petição será dirigida ao órgão competente para o julgamento do recurso, salvo
se sujeito ao duplo juízo de admissibilidade, caso em que deve ser dirigida ao
órgão responsável pelo primeiro deles. Deve conter a qualificação das partes,
exigência dispensável se recorrente e recorrido estiverem devidamente
qualificados nos autos (MOREIRA, 2001, p. 423), a motivação ou razões da
impugnação da decisão e o pedido de reforma. Atualmente, insere-se nos
requisitos de regularidade formal do recurso extraordinário a demonstração da
existência da repercussão geral. Num primeiro momento, o Supremo Tribunal
Federal, foi extremamente rigoroso a esse respeito, exigindo que essa
demonstração fosse feita em capítulo destacado; atualmente, adota uma posição
mais instrumentalista.
Os
fundamentos do pedido recursal devem ser conexos aos fundamentos da decisão,
impugnando especificamente cada um deles, sob pena de não conhecimento do
recurso. Essa a dicção da Súmula 182 do STJ: "E
inviável o agravo do artigo 545 do CPC que deixa de atacar
especificamente os fundamentos da decisão agravada". Esta exigência se
estende a todos os recursos, inclusive aos oralmente interpostos (SOUZA, 2000,
p. 81), e deve ser cumprida no momento da interposição (ASSIS, 1999, p. 42).
Quanto
aos recursos especial e extraordinário, é necessário cuidar de algumas
especificidades. O seu cabimento se dá, respectivamente, se a decisão atacada
contrariar lei federal ou a Constituição, por isso, na motivação, o recorrente
deve demonstrar a ocorrência dessas. No caso da interposição do recurso
especial pela letra 'c' do permissivo constitucional, cabe ao recorrente
demonstrar tanto a similitude entre os casos confrontados quando a divergência
jurisprudencial — transcrevendo e comparando trechos — entre os julgados (NERY
J1JNIOR 1997, p. 311), naquilo que a jurisprudência apelida de cotejo
analítico. O agravo de instrumento contra o despacho de inadmissão do recurso
especial ou extraordinário tem, por sua vez, como requisito de admissibilidade
específico — no que diz respeito a regularidade formal —, a sua correta instrução com todas as peças
obrigatórias ou essenciais à compreensão da controvérsia.
Deve
o recorrente, também, pedir expressamente a reforma da decisão hostilizada, sob
pena de incorrer na irregularidade formal, dando ensejo ao não conhecimento do
recurso.
Bernardo
Pimentel Souza (2000, p. 82) adverte que importaria julgamento extra petita se
o juízo desse provimento a recurso ao qual faltasse pedido de reforma. A nós,
parece que a falha é mais grave. Recurso que não contém pedido de reforma é um
não-recurso, um recurso inexistente.
Por
fim, a petição deve ser assinada por advogado regularmente constituído, sem o
que será tido recurso por inexistente (ASSIS, 1999, p. 44). Cabe o registro,
entretanto, de que, nas instâncias ordinárias, há a necessidade de abertura de
prazo para regularização da representação processual, ao contrário do que
acontece nas instâncias superiores, em que a jurisprudência se fixou no sentido
da desnecessidade da diligência supraindicada, sendo, de logo, declarada a
inexistência do recurso.
1.4.7 Preparo
O
preparo, na lição de Barbosa Moreira (2001, p. 390), consiste "no
pagamento prévio das despesas relativas ao processamento" do recurso. Deve
ser prévio e comprovado no momento da protocolização da petição recursal, a não
ser que seu valor não possa ser conhecido antecipadamente ou que motivo relevante
impeça o recorrente de cumprir a exigência legal como, por exemplo, a falta de
coincidência entre os expedientes forense e bancário (a jurisprudência oscilou
bastante a esse respeito, mas hoje é prevalecente a tese no sentido de que, em
caso de descoincidência de horários, é facultado ao recorrente pagar o preparo
no primeiro dia útil subsequente).
A irregularidade no cumprimento da exigência formal do
preparo tanto pode decorrer da ausência de pagamento como da insuficiência do
valor recolhido em relação ao valor estipulado. A lei comina a pena de deserção
à falta de preparo; entretanto, no caso da insuficiência é necessário abrir
oportunidade ao recorrente para que lhe complemente o valor.
A deserção resulta na inadmissibilidade do
recurso, já que operada a prec1usão consumativa do direito de recorrer, de nada
adiantando a apresentação da guia de recolhimento do preparo após a
interposição do recurso, ainda que essa interposição tenha sido feita antes do
último dia do prazo
Provando o apelante justo impedimento, o juiz
relevará a pena de deserção, fixando-lhe prazo para efetuar o preparo.
Como
já mencionado alhures, há algumas hipóteses de dispensa de preparo, fundadas
ora em critério subjetivo, ora em critério objetivo (MOREIRA, 2001, p. 392-393;
NERY JUNIOR, 1997, p. 360). Exemplos da primeira situação são, segundo Bernardo
Pimentel Souza (2000, p. 86), os recursos interpostos pelo Ministério Público,
União, Estados e Distrito Federal, Municípios e autarquias, nos termos do artigo
511 do CPC, e também os interpostos pelos beneficiários da justiça gratuita na
forma dos arts. 3° e 9° da Lei n° 1.060/50.
Quanto
à assistência judiciária gratuita, já
decidiu o Superior Tribunal de Justiça que obstar a subida de agravo de instrumento
desacompanhado da guia de recolhimento do porte de remessa e retorno, tendo
sido interposto o recurso especial (inadmitido ao fundamento da deserção)
justamente para discutir o desacolhimento do pedido de gratuidade da justiça,
importa usurpação de competência (RCL 1036/SP, 1a S., Min. Teori
Zavascki, DJ de 13.10.2003); e
também que, havendo pedido de gratuidade da justiça como preliminar de recurso,
este não pode ser julgado deserto antes de analisado o referido pedido, e, no
caso de não-acolhimento, antes que seja oportunizado à parte o recolhimento do preparo (RESP 440.007/RS, 3a
T., Min. Castro Filho, DJ de
19.12.2002).
São
exemplos de dispensa de preparo fundada em critério objetivo: o agravo retido (artigo
522, parágrafo único, do C´PC), os embargos de declaração (artigo 536 do CPC) e
os "recursos interpostos em processos regidos pela Lei n. 8.069/90,
Estatuto da Criança e do adolescente", por força do seu artigo 198, I.
EFEITOS DOS RECURSOS
Considerações gerais
Com relação aos efeitos dos
recursos, e como visto em relação a outros tópicos na Parte I, também a
doutrina não ajusta um entendimento uniforme. O que existe de incontroverso é
apenas o fato de que todos admitem que os recursos possuem efeitos devolutivo e suspensivo (e nem sempre
com a mesma dimensão). Para Barbosa Moreira, há um efeito comum a todos os
recursos do direito nacional, o de obstar, uma vez interpostos, o trânsito em
julgado da decisão impugnada. Ao lado desse efeito, o referido processualista
se reporta aos efeitos devolutivo e suspensivo. Lembra, também, que parte da
doutrina refere-se ao efeito extensivo, ao qual tece críticas (MOREIRA, 2003,
p. 256).
De
sua vez, Nelson Nery Jr. considera que o adiamento da formação da coisa julgada
é apenas uma consequência natural e 1ógica do efeito devolutivo, sendo os dois
efeitos apontados pela doutrina tradicional o devolutivo e o suspensivo (NERY
JR., 2004, p. 429). Esse doutrinador, entretanto, aponta outros fenômenos
processuais concernentes à interposição do recurso os quais não se enquadram na
mencionada dicotomia (efeitos devolutivo e suspensivo), que seriam os efeitos:
expansivo, translativo e substitutivo (NERY JR., 2004, p. 428).
Vejamos
estes cinco efeitos: devolutivo, suspensivo, expansivo, translativo e substitutivo.
Efeito Devolutivo
Esse
efeito é definido por Barbosa Moreira do seguinte modo: "chama-se
devolutivo ao efeito do recurso consistente em transferir ao órgão ad quem o conhecimento da matéria julgada em
grau inferior de jurisdição." (MOREIRA, 2003, p. 259)
Para
Nelson Nery Jr., o efeito devolutivo seria uma manifestação do principio
dispositivo. O recurso interposto, considerado como uma espécie de renovação do
direito de ação, em outra fase do procedimento, devolveria ao órgão ad quem o
conhecimento da matéria impugnada. O pedido de nova decisão fixaria os limites
e o âmbito de devolutividade do recurso, segundo o brocardo tantum devolutum
quantum appellatum (NERY JR, 2004, p. 429). Esse autor afirma que o efeito
devolutivo e comum a todos os recursos no sistema processual civil brasileiro,
sendo o efeito natural de todo e qualquer recurso (NERY JR., 2004, p. 431).
Quanto
a essa afirmação, guardamos a mais absoluta reserva. Cremos que o efeito
devolutivo é uma inerência dos recursos verticais, mas não necessariamente dos
recursos horizontais, como, e.g., os
embargos de declaração. Embora aparentemente (e só aparentemente) divirja do
que é por nós sustentado, Barbosa Moreira indica a existência de dissenso
doutrinário sob a égide do código anterior: a maioria dos autores reconhecia
ocorrer o efeito suspensivo, em maior ou menor amplitude, quando houvesse novo
julgamento de alguma questão. Entretanto, parcela da doutrina considerava que
apenas em relação à reapreciação da causa, entendida como mérito, estaria
presente o efeito devolutivo. (MOREIRA, 2003, p. 259)
Segundo
Barbosa Moreira, alguns autores italianos defendiam a limitação do efeito
devolutivo apenas às questões que o juízo superior pudesse apreciar de forma
automática, independente da iniciativa das partes. Nesse caso, conforme o
mencionado autor: "O mecanismo do efeito devolutivo somente seria
necessário para explicar a atividade cognitiva em nível mais alto com
referência à matéria que não seja objeto de suscitação especificada dos
litigantes." (MOREIRA, 2003, pp. 259-260). A questão, porém, estaria
superada em relação ao direito brasileiro, dado que o Código de Processo Civil
de 1973 adotou a noção genérica do efeito devolutivo. Assim, todo recurso seria
provido de efeito devolutivo, consoante lição de Barbosa Moreira (MOREIRA,
2003, p. 259):
[ ... ] De lege lata, há
devolução sempre que se transfere ao órgão ad quem algo do que fora
submetido ao órgão a quo - algo, repita-se; não necessariamente tudo.
Inexiste, portanto, recurso totalmente desprovido de efeito devolutivo, com
ressalva dos casos em que o julgamento caiba ao mesmo órgão que proferiu a
decisão recorrida o que pode acontecer, [ ... ], e que variem, de um para outro
recurso, a extensão e a profundidade do aludido efeito. Aquela -
desde já convém observar - nunca ultrapassará os lindes da própria impugnação:
no recurso parcial, a parte não impugnada pelo recorrente escapa ao
conhecimento do órgão superior, salvo se por outra razao (como nos casos do artigo
475) este se houver de pronunciar ao propósito.
Quando bem se lê a citação do trabalho
de Barbosa Moreira, percebe-se que, tal como nós, também ele entende que nos
recursos horizontais não cabe falar em efeito devolutivo. Há aí outro fenômeno
que pode chamar-se efeito regressivo, efeito de retratação, etc.
Também
Ovídio Batista leciona que somente haveria efeito devolutivo nas situações nas
quais o reexame estaria confiado a órgão superior (SILVA, 2000, p. 413):
Nossa doutrina, no entanto, desde os
velhos processualistas do século XIX, entende por efeito devolutivo a
circunstância de confiar-se o reexame da decisão recorrida a um órgão de
hierarquia superior, razão pe1a qual não haveria efeito devolutivo sempre
que o exame da controvérsia contida no recurso fosse entregue ao próprio
magistrado pro1ator da decisão impugnada. [ ... ]
No
caso de nova apreciação da matéria pelo órgão a quo, Ovídio Batista
afirma que haveria o efeito de retratação (SILVA, 2003, pp. 415-416):
Quando o recurso é interposto a fim de
que o próprio juiz pro1ator da decisão recorrida reexamine o que fora por ele
próprio decidido, diz-se que o recurso provoca um juízo de retratação, desde
que, neste caso, ao contrário daque1e em que ocorra apenas o efeito devo1utivo
em toda sua pureza, dá-se ao julgador que tivera sua decisão impugnada a
possibilidade de revê-1a e modificá-1a.
Noutra linha, e agora concordando como
Nelson Nery Jr., o objeto da devolutividade constitui o mérito do recurso, ou
seja, a matéria sobre a qual deve o órgão ad quem pronunciar-se,
provendo-o ou desprovendo-o. As matérias preliminares alegadas normalmente em
contrarrazões de recurso, como as de não-conhecimento, por exemplo, não
integram o efeito devolutivo do recurso, pois são matérias de ordem pública a
cujo respeito o tribunal deve ex officio pronunciar-se. Aduz esse
professor que seria mais apropriado dizer-se que esse tipo de questão fica ao
exame do tribunal pelo denominado efeito translativo do recurso, dado
que o efeito devolutivo é manifestação do princípio dispositivo: somente se
devolve ao tribunal a matéria que o recorrente efetivamente impugnou e sobre a
qual pede nova decisão.
Em princípio, existe vedação ao órgão a
quo para a modificação do julgamento. As exceções consistem nos Embargos de
Declaração, em relação aos quais sustentamos que não há efeito devolutivo, e no
agravo retido, devido à possibilidade
de juízo de retratação. Nessa última hipótese, somente haverá efeito devolutivo
diferido, i.e., condicionado à
mantença da decisão pelo seu prolator.
Cabe
uma palavra para lembrar que o efeito devolutivo possui duas dimensões: uma horizontal, para caracterizar o quanto
da decisão foi impugnada, dado que sempre existe a possibilidade dos chamados
recursos parciais, como também que a própria decisão recorrida pode não haver
examinado a demanda ou toda a demanda, caso em que o mérito do recurso poderia
não coincidir (total ou parcialmente) com o mérito da causa; outra vertical, para caracterizar quais
matérias sobem ao exame do órgão encarregado de apreciar a irresignação.
Segundo pensamos, na generalidade dos casos, a devolutividade vertical é ampla
e se rege muito mais pela quantidade da matéria recorrida do que pelos
fundamentos de que possa lançar mão o recorrente. Nesse sentido, a matéria
relativa à devolutividade vertical reger-se-ia, sobretudo pelo artigo 515, e
seus parágrafos 1º e 2º. Há posições contrárias, sustentando que esses
parágrafos são manifestações do efeito translativo, que será examinado logo
mais.
Ressalvamos,
quanto ao tema efeito devolutivo, os recursos excepcionais, que são
considerados doutrinariamente como recursos de devolutividade estrita, no
sentido de que, embora incida o efeito devolutivo, isso somente ocorre com
relação à matéria jurídica que pode ser conhecida pela instância de
superposição, que não é vocacionada para discussão de matéria de fato.
Efeito suspensivo
Segundo
Barbosa Moreira, diz-se que um recurso tem efeito suspensivo quando impede a
produção imediata dos efeitos da decisão. O mesmo autor indica que não se trata
apenas de impedir a execução imediata, pois há provimentos constitutivos e
dec1aratórios, os quais não comportariam execução, que também podem ser
impugnados por recurso que possuem efeito suspensivo. Dessa forma, ressalvada
exceção contida na lei, a suspensividade abrangeria toda a eficácia da decisão,
além de sua eventual força como titulo executivo (MOREIRA, 2003, p. 257).
ParaNelson Nery
Jr. (NERY JR., 2004,
p. 445):
O efeito suspensivo é uma qualidade do
recurso que adia a produção dos efeitos da decisão impugnada assim que
interposto o recurso, qualidade essa que perdura até que transite em julgado a
decisão sobre o recurso. Pelo efeito suspensivo, a execução do comando
emergente da decisão impugnada não pode ser efetivada ate que seja julgado o
recurso. [ ... ]
Ovídio
Batista assevera: "Diz-se que determinado recurso possui efeito
suspensivo quando sua interposição impede que os efeitos da sentença
impugnada se produzam desde logo, prolongando, assim, o estado de ineficácia
peculiar à sentença sujeita a
recurso." (SILVA, 2000, p. 414)
Barbosa Moreira critica, com absoluta
razão, a denominação efeito suspensivo, porque induziria a supor que, apenas
com a interposição do recurso, os efeitos da decisão estariam tolhidos, ou
seja, até esse momento a decisão estaria plenamente operante. O mencionado
autor observa que:
"Na realidade, o contrário é que
se verifica: mesmo antes de interposto o recurso, a decisão, pelo simples fato
de estar-lhe sujeita, é ainda ineficaz, e a interposição apenas prolonga
semelhante ineficacia, que cessaria se não se interpusesse o
recurso." (MOREIRA, 2003, p. )
Nesse mesmo sentido Nelson Nery Jr.
(NERY JR., 2004, p. 445): "[ ... ] A decisão que ainda não havia produzido
efeitos, porque não prolatada, continua a não produzi-los pelo efeito
suspensivo do recurso, pois a eficácia não preexiste à interposição do recurso que não pode, por certo, suspendê-la. [
... ]" A seguir, o autor, com fundamento nesse excerto, afirma que a suspensividade
estaria mais perto da recorribilidade, do que propriamente do recurso.
Justifica a assertiva ao afirmar que o efeito suspensivo seria iniciado com a
publicação da sentença e permaneceria, pelo menos até o transcurso do prazo
oferecido ao interessado para recorrer.
Alerta
Barbosa Moreira que, no direito alienígena, há diferença entre suspensividade
do recurso e suspensividade do prazo do recurso. No primeiro caso, a eficácia
da decisão se daria desde a sua prolação, sendo suspensa uma vez interposto o
recurso com efeito suspensivo. No segundo, a decisão não seria eficaz durante o
prazo de interposição. Essa diferença existiria no direito belga e no
ordenamento francês, neste, até a reforma do código de processo civil de 1965.
Sustenta
Nelson Nery Jr. que, no caso de ações cumuladas em relação às quais haja
previsão de recursos com efeitos diversos (suspensivo e devolutivo para uma
delas e apenas devolutivo para a outra), o efeito suspensivo está restrito
apenas à parcela da decisão para a qual haja previsão de recurso dotado de tal
efeito, podendo ser objeto de execução provisória o restante dela. (NERY JR.,
2004, p. 447)
Em
regra, a decisão é exequível, excetuada a interposição de recurso com efeito
devolutivo e suspensivo. Barbosa Moreira enuncia os casos que, embora tenha
sido manejado recurso dotado de efeito suspensivo, a sentença já opera seus
efeitos: "Sao efeitos que, por assim dizer, escapam não só a força
inibitória da recorribilidade in genere, mas também — o que e absolutamente
excepcional — a força inibitória da recorribilidade por meio
suspensivo." (MOREIRA, 2003, p. 479)
A
primeira tem pertinência com a prova literal de dívida líquida e certa. Para
efeito de concessão de arresto, a sentença, líquida ou ilíquida, pendente de
recurso, condenando o devedor ao pagamento de dinheiro ou de prestação que em
dinheiro possa converter-se (parágrafo único do artigo 814 do Código de
Processo Civil) a sentença já opera efeitos e conduz à adoção de providências
práticas.
A
segunda hipótese está prevista no inciso II do artigo 822 do Código de Processo
Civil: o juiz, a requerimento da parte, pode decretar o sequestro dos frutos e
rendimentos do imóvel reivindicando, se o réu, depois de condenado por sentença
ainda sujeita a recurso, os dissipar.
A
terceira consiste na constituição de título para a hipoteca judicial, prevista
no caput do artigo 466 do Código de Processo Civil. Embora não haja
previsão explícita na lei, afirma Barbosa Moreira: "Ora, se se concede a
hipoteca judiciária mesmo quando a sentença seja provisoriamente
exequível, isto é, quando o recurso cabível não tenha efeito suspensivo,
a fortiori quando o tenha, e por conseguinte não haja lugar para a
penhora ou medida equivalente. Em tal hipótese, precisamente, é que a hipoteca
judiciária poderá revelar-se mais útil." (MOREIRA, 2003, pp. 480-481)
Com
relação a essa eficácia, Nelson Nery Jr. acrescenta que, embora haja recurso
com efeito suspensivo, o juiz pode ordenar providências conservatórias
urgentes, bem como não é defeso à parte
manejar ação cautelar também para assegurar a eficácia do futuro provimento
jurisdicional. Isso, entretanto, segundo pensamos, não tem pertinência com
alguma excepcional eficácia da sentença sujeita a recurso com efeito
suspensivo. Deveras, sempre é possível tomar alguma das providências sugeridas,
ainda que não tenha sido prolatada sentença. Em outras palavras, estão
presentes, aí, hipóteses em que a proteção cautelar prometida pelo Estado é
possível, independentemente de haver ou não sentença proferida.
Tem-se
dito que a regra, no ordenamento jurídico pátrio, é a da suspensividade dos
recursos. Para a sua exclusão, há necessidade de norma especial. Nesse sentido,
Barbosa Moreira: "E que a regra,
na matéria, e a suspensividade, como, aliás, ressumbra do tratamento
dado, no particular, à apelação. Por conseguinte, sempre que o texto silencie,
deve entender-se que o recurso é dotado de efeito suspensivo: assim
ocorre com os embargos infringentes. Esse já era, aliás, o princípio no sistema
do Código de 1939." (MOREIRA, 2003, p. 283)
Cogitamos,
em passado recente, afirmar, que essa seria uma tendência em transformação, por acreditar que o legislador estava a
caminhar para o abandono da suspensividade como regra, e para a admissão da
mais pronta efetividade da prestação jurisdicional, reservando a dação do
efeito suspensivo apenas para aquelas situações em que houvesse possibilidade
de dano irreversível para o sucumbente, situações em que esse efeito poderia
ser conferido pelo próprio juiz, não por previsão legal (ope legis), mas sim porque o juiz encontrasse presentes, no caso
concreto, as circunstâncias de dano iminente que sugerisem a sua concessão (ope judicis).
Nesse
mesmo período, advertia Ovídio Batista afirmava que a tendência do direito moderno
consistia em restringir os recursos com efeito suspensivo. Entretanto, essa
tendência não estaria sendo seguida pelo direito pátrio (SILVA, 2000, p. 415). Objetamos
que a afirmação contrastava com dados objetivos: primeiro, porque a Lei de Ação
Civil Pública já contempla a concessão de efeito suspensivo na modalidade por
nós indicada; depois porque hvia projeto de lei tramitando no parlamento no sentido de alterar o artigo 520 do Código
de Processo Civil, justamente visando a alterar a forma de deferimento de
efeito suspensivo, como meio de valorizar a decisão proferida mo primeiro grau
de jurisdição.
Efeito Expansivo
No
que concerne a esse efeito, a melhor sistematização que se conhece está nos
trabalhos de Nelson Nery Jr. (NERY JR., 2004, p. 477): "O julgamento do
recurso pode ensejar decisão mais abrangente do que o reexame da matéria
impugnada, que é o mérito do recurso."
Para Nélson Nery, o efeito expansivo
pode ser objetivo ou subjetivo, interno ou externo. É interno quando ocorre em
relação a um mesmo ato impugnado (NERY JR., 2004, p. 478). Como exemplo de
efeito objetivo interno, Nelson Nery JR. cita o caso de acolhimento de
preliminar de litispendência, que acarreta a invalidação da sentença, com a
extinção do processo sem julgamento do mérito. Outro exemplo consiste no
provimento do apelo que ataca a questão da existência do an debeatur, que
prejudica a questão do quantum debeatur. Também consiste em aplicação
desse efeito a reforma de decisão que condenou o réu a indenizar, estendida a
condenação às despesas processuais e aos honorários de advogado.
O
efeito expansivo externo se dá "relativamente a outros atos praticados no
processo, e não apenas ao mesmo ato impugnado" (NERY JR. 2004, p. 478).
Por exemplo, o provimento de agravo de instrumento pelo tribunal ad quem, que
acarretaria tornar sem efeito os atos processuais praticados posteriormente à
sua interposição, que sejam incompatíveis com a sua decisão. Vale dizer que a
jurisprudência com relação a esse efeito é extremamente controvertida. Há
decisões no STJ que o adotam a há decisões que o hostilizam.
Também caberia nos efeitos
supraindicados a hipótese dos atos praticados no curso da execução provisória
da sentença, após o provimento de recurso recebido apenas no efeito devolutivo
(NERY JR., 2004, p. 478).
Há
também expansão dos efeitos de forma subjetiva, ou efeito expansivo subjetivo.
Como exemplo, Nelson Nery Jr. cita o recurso interposto por um dos
litisconsortes, no caso de litisconsórcio unitário. Também afirma o mencionado
autor, no que concerne à assistência
litisconsorcial, que (NERY JR., 2004, p. 479):
Nada obstante ser a atividade do assistente
litisconsorcial (CPC 54) absolutamente distinta e autônoma da do assistido,
o recurso interposto pelo assistente litisconsorcial também aproveita ao
assistido, pois a lide é comum aos dois em face do regime da unitariedade
litisconsorcial que os une, embora quanto à formação se tratasse de litisconsórcio facultativo. A
recíproca é verdadeira: interposto
recurso pelo assistido, atingirá a esfera de direito material do assistente
litisconsorcial que não recorreu.
Também
configura efeito expansivo objetivo a interposição de recurso contra decisão
condenatória apenas pela seguradora litisdenunciada. Segundo Nelson Nery JR., a
seguradora seria assistente simples da ré: "Para a re-denunciante ocorreu
prec1usão temporal (não pode mais interpor recurso), mas não se formou, ainda,
a autoridade da coisa julgada sobre a sentença, obstada pela interposição da
apelação pela seguradora denunciada" (NERY JR., 2004, p. 481).
Para
fundamentar seu entendimento, Nelson Nery disseca a dimensão do parágrafo único
do artigo 509 do CPC (NERY JR., 2004, p. 481):
O CPC 509 par.un. não transforma o
litisconsórcio simples em unitário, como poderia parecer à primeira vista, mas tão-somente "impõe
a extensão dos efeitos do recurso" ao litisconsorte simples que não
recorreu, em virtude da solidariedade existente entre os litisconsortes. Na
verdade, o dispositivo determina a extensão dos efeitos do julgamento do
recurso ao litisconsorte simples inerte, que tern vínculo de solidariedade com
o litisconsorte recorrente.
Já
foi dito, em caráter prefacial, que não há unanimidade com relação a esses
efeitos, Especificamente com relação ao ora estudado, Barbosa Moreira,
denominando-o extensivo, observa que era objeto de comentários com frequência
entre os processualistas penais italianos (Carnelutti, Del Pozzo, Petrella,
Pisapia e Cristiani). Realmente são se trata de urn efeito propriamente dito. O
que ocorre é o aproveitamento de urn recurso pelos demais litisconsortes o que
implica a extensão subjetiva dos efeitos propriamente ditos (MOREIRA, 2003, pp.
256-257).
Efeito Translativo
Normalmente,
a atuação do órgão ad quem limita-se ao pedido do recorrente, com
fundamento no princípio dispositivo. Entretanto, assevera Nelson Nery Jr que
(NERY JR., 2004, p. 482):
Há casos, entretanto, em que o sistema
processual autoriza o órgão ad quem a julgar fora do que consta das razões
ou contra-razões do recurso, ocasião em que não se pode falar em julgamento extra,
ultra ou infra petita. Isto ocorre normalmente com as questões de
ordem pública, que devem ser conhecidas de ofício pelo juiz e a cujo
respeito não se opera a preclusão (por exemplo, artigo 267 § 3° e 301 § 4°). A translação dessas questões ao juízo ad
quem esta autorizada no artigo 515
§§ 1° a 3° e 516.
Já afirmamos, em outro
momento, que, diferentemente do que sustentado pelo Professor Nélson Néry, a
hipótese, aí, é de efeito devolutivo e não translativo, que, segundo pensamos,
deve ser limitada a questões de ordem pública. A abrangência dos §§ 1º e 2º do artigo
515 ultrapassa em muito essas questões.
Estamos
acordes, porém, em que as questões de ordem pública podem ser analisadas pelo
tribunal, assim como as questões dispositivas que não foram analisadas pelo juízo
a quo, embora tenham sido suscitadas e debatidas (NERY JR., 2004, pp.
482-483).
Quadra
consignar que, quando se trata do exame de matérias por força do efeito
translativo, em sede de doutrina, não se cogita da incidência ou não-incidência
da proibição da reformatio in pejus. Dizendo
de outra forma, se se trata de efeito translativo, pode haver eventual
agravamento da situação do recorrente. Pelos mesmos motivos, não caberia falar
em proibição da reformatio in pejus quando
se tratasse de hipóteses relativas ao duplo grau de jurisdição obrigatório (artigo
475 do CPC), até porque, na hipótese, de recurso não se trata. Sem embargo
disso, a jurisprudência do STJ tem se solidificado no sentido de que, também
nessas circunstâncias não cabe ao Tribunal agravar a situação da Fazenda
Pública.
Questão
interessante é observada quando o autor postula a condenação do réu pelas
verbas x e y. O pedido é julgado procedente. Entretanto, o réu apela apenas da
verba x, ou seja, há recurso parcial. Na instância superior é observada ofensa
a questão de ordem pública. Fica a indagação sobre se houve formação de coisa
julgada em relação à verba y, ou seja,
se haveria a desconstituição da sentença apenas no que concerne a x, ou se
poderia haver a desconstituição completa da sentença.
Barbosa Moreira apoia a primeira
hipótese (MOREIRA, 2003, p. 356):
Por outro lado, quaisquer questões
preliminares, embora comuns à
parte impugnada e à parte não-impugnada da decisão, só com referência àquela podem ser apreciadas pelo tribunal do
recurso. Suponhamos, v.g., que a sentença, repelindo a alegação de
faltar ao autor legitimatio ad causam, condene o réu ao pagamento de x.
Apela o vencido unicamente para pleitear a redução do quantum a y.
Ainda que o órgão ad quem se convença da procedência da preliminar -
que em princípio, como é óbvio, levaria à declaração da carência da actio quanta
ao pedido todo -, já que não lhe será lícito pronunciá-la senão no que
respeita a x-y, única parcela que, por força do recurso (e ressalvada a
eventual incidência de regra como a do artigo 475, nº I, que torne obrigatória
a revisão), se submete a cognição do juízo superior. No tocante a parcela y,
que não é objeto da apelação - nem, por hipótese, se devolve
necessariamente -, fica vedada ao tribunal exercer atividade cognitiva: o
capítulo correspondente passou em julgado no primeiro grau de jurisdição.
O mesmo princípio aplica-se a hipótese
de só versar a impugnação sobre um ou
alguns dos capítulos recorríveis, embora com invocação de vício que, se
existente, poderia acarretar a invalidação total da decisão. Assim, v.g.,
se o réu, condenado a pagar x+y, funda a sua apelação na denúncia de
suposto error in procedendo, mas pleiteia unicamente a anulação da
sentença quanto a x. Mesmo que o tribunal conheça do vício, e este afete
por inteiro o julgamento
de primeiro grau, não se poderá anular a decisão no concernente a y; tal
capítulo transitou em julgado.
Nelson Nery Jr. Abre dissidência (NERY,
JR. 2004, p. 485):
[ ... ] A tão-só interposição do
recurso, em virtude do efeito translativo, faz com que fiquem
transferidas ao reexame do tribunal destinatário as matérias de ordem pública,
dentre as quais se inclui a relativa às condições da ação (CPC 267 § 3°). A
interposição do recurso adiou o trânsito em julgado quanta a essas matérias de
ordem pública, muito embora tivesse havido preclusão para o réu quanta à
verba y, que não foi objeto das razões e do pedido constante do apelo. [ ... ]
Hoje
em dia, há dúvida sobre se o efeito translativo é cabível "nos recursos
excepcionais (recurso extraordinário, recurso especial, e embargos de
divergência)". A jurisprudência do STJ é extremamente pendular a esse
respeito. Ora admite que, tendo sido conhecido o recurso especial, deve
examinar as questões cognoscíveis de ofício; ora afirma que o conhecimento
dessas matérias não está infenso ao
presquestionamento.
Efeito substitutivo
O
efeito substitutivo não é um efeito propriamente do recurso. É um efeito do
julgamento do recurso, que, por força do disposto no artigo 512 do CPC, faz com
a decisão de mérito do recurso substitua integralmente a decisão recorrida na
exata medida do recurso e da decisão nele proferida.
Para
haver efeito substitutivo há necessidade de o recurso ser admitido, e ser analisado no mérito.
O efeito substitutivo também ocorre no caso de ser negado provimento ao
recurso:
[ ... ] Tanto no caso de provimento
como no de improvimento, somente existe efeito substitutivo quando o
objeto da impugnação for error in iudicando e, portanto, o tribunal ad
quem tiver de manter ou reformar a decisão recorrida. Quando, ao contrário,
se tratar de recurso que ataque error in procedendo do juiz, a substitutividade
somente ocorrerá se negado provimento ao recurso, pois, se este for provido,
anulará a decisão recorrida e por óbvio não poderá substituí-la. NERY JR..,
2004, P. 489)
Barbosa
Moreira, ao analisar o artigo 512 do CPC, denominando não efeito, mas,
corretamente, função substitutiva do recurso, sustenta que somente haveria
substituição no caso de error in iudicando, tanto nas hipóteses de denegação como de provimento do recurso.
Dessa forma, exclui o efeito substitutivo ao recurso que teve provimento
negado, quando este tiver impugnado apenas error in procedendo:
[ ... ] É claro que não se pode estar aludindo
senão às hipóteses [em] que tribunal conhece
do recurso, lhe aprecia o mérito. Nas outras, seria absurdo cogitar-se de substituição:
não se chegou sequer a analisar, sob qualquer aspecto, a matéria que, no
julgamento inferior constituiria objeto da impugnação do recorrente.
[ ... ], mesmo quando se conhece do
recurso, tanto pode acontecer que o objeto da atividade cognitiva exercida pelo
órgão ad quem coincida (ao menos do ponto de vista qualitativo) com o
objeto da atividade exercida pelo órgão a quo (casos de impugnação por error
in iudicando), como é possível que, na instância superior, seja diverso o
objeto da cognição (casos de impugnação por error in procedendo). E a
diferença é re1evantíssima, ao ângulo que agora os situamos: só no primeiro
grupo de casos e que se falará, com propriedade, de "substituição" da
decisão recorrida pelo julgamento do recurso; unicamente aíi, com efeito,
passará a decisão do órgão ad quem a ocupar o lugar daquela.
RECURSOS EM ESPÉCIE
Recurso de Apelação
A apelação é o recurso por excelência,
recurso de fundamentação livre, que se presta, na forma do art. 514 do Código
de Processo Civil, a impugnar a sentença proferida pelo juiz do primeiro grau
de jurisdição, seja ela sentença que tenha resolvido o mérito da causa, seja
ela sentença de natureza meramente processual, como a sentença que extingue o
processo sem resolução de mérito, na forma do art. 267 do Código de Processo
Civil.
Anote-se que há algumas sentenças das
quais não cabe recurso de apelação, tais assim as proferidas nos juizados
especiais de pequenas causas, tanto federais como estaduais, que desafiam
apenas e tão somente o recurso previsto na sua própria regência (recurso
inominado), as de que trata o art. 34 da Lei nº 6.830, de 1980, das quais
somente cabem embargos infringentes, e aquelas proferidas em situações
previstas por juízes federais, na forma da competência estabelecida no art.
109, , da Constituição Federal, que
somente podem ser hostilizadas por meio de recurso ordinário para o Superior
Tribunal de Justiça, na forma do disposto no art. 105, II, da Constituição
Federal.
Consoante já afirmado em outro momento,
a história do recurso de apelação confunde-se com a história do Direito Romano,
especificamente com o início do período da cognitio
extraodinem, quando a sentença deixou de ser proferida por um cidadão
qualquer e passou a sê-lo por um funcionário do Estado. Desse momento em
diante, pode-se dizer que ocorreu a institucionalização do recurso de apelação.
Assemelhava-se, nos primeiros momentos, a uma súplica dirigida ao superior
hierárquico do prolator da decisão judicial com o objetivo de reformar a decisão
desfavorável. Somente mais tarde, no direito intermédio com o surgimento da querela nulitatis (sanabilis e insanabilis) é que o recurso de apelação passou a ser
veículo de inconformação apto a alçar ao tribunal ordinário também os vícios de
natureza processual (nulidades processuais), com o objetivo de cassar a
sentença proferida. A matéria será mais bem examinada quando cuidarmos da ação
rescisória.
Não
obstante o Código de Processo Civil seja extremamente generoso no que concerne
à forma dos atos processuais, é bom que se diga que, no concernente aos
recursos em geral e, no que nos interessa agora, no que diz com o recurso de
apelação, a regra que prevalece é a da regularidade formal. O apelante há de
seguir adequadamente as regras que lhe são impostas no artigo 514 do Código,
que estabelece o que deve conter um recurso da espécie.
Na
prática da advocacia criou-se o costume de seccionar o recurso de apelação em
duas partes: a primeira, uma espécie de folha de rosto, devidamente datada e
assinada, dirigida ao juiz que prolatou a sentença, em que o recorrente
assevera sua inconformação com a decisão que lhe foi desfavorável, indica que
está a recorrer, naquele momento, e pede a remessa das razões de recurso, com o
comprovante do pagamento do preparo (quando for o caso) e do porte de remessa e
de retorno ao tribunal competente para o julgamento do recurso; a segunda,
dirigida ao tribunal, com a narração da situação fático-jurídica até aquele
momento, dos principais aspectos da sentença que lhe foi desfavorável, e
indicação das razões de direito processual e material que substanciam a
fundamentação recursal e, finalmente, com o pedido de cassação ou reforma da
decisão, com o fecho igualmente datado e assinado.
Embora essa divisão em duas
peças, embora esteja incorporada na prática da advocacia, não é obrigatória. O
advogado pode optar por fazer tudo em uma única peça, desde que estejam
atendidos todos os requisitos exigidos pelo art. 514 do Código de Processo
Civil: ser dirigida ao juiz, os nomes e qualificação das partes (no mais das
vezes, a qualificação é desnecessária porque já existente na petição inicial e
na contestação), os fatos e fundamentos de direito e o pedido de reforma de
nova decisão. Cabe o registro adicional no sentido de que o advogado não deve olvidar
de apor sua assinatura na petição do recurso de apelação. Se não o fizer,
entretanto, deverá a autoridade julgadora ensejar oportunidade a que o advogado
supra a falta no prazo que lhe for deferido.
Com
a interposição do recurso de a apelação, por força do disposto no art. 515 do
Código, é devolvido ao tribunal o conhecimento da matéria impugnada, como foi
visto quando tratamos do efeito devolutivo, Esclarece o § 1º desse mesmo artigo
que serão objeto de apreciação e julgamento pelo tribunal todas as questões
suscitadas e discutidas no processo, ainda que a sentença não as tenha julgado
por inteiro. Implica dizer, por força do mesmo efeito devolutivo, as questões
controvertidas no processo, que deveriam encontrar decisão e solução adequada
na sua sede própria, a sentença, mesmo que tenham sido olvidadas pelo juiz de
primeiro grau, deverão ser examinadas pelo tribunal que lhe é superior. Também
assim, certas questões que deveriam encontrar desate em momento anterior à
sentença (v.g., a apreciação da impugnação do valor da causa, ou a deliberação
sobre o pedido de justiça gratuita), por meio, por exemplo, de uma decisão
interlocutória, serão no julgamento da apelação examinadas, por força do
disposto no art. 516 de Código.
Também
já dissemos em momento anterior, estamos alinhados dentre aqueles que entendem
tratar o § 2o do art. 515 de uma especial hipótese de efeito
devolutivo, Assim, quando o pedido ou a defesa tiver mais de um fundamento e o
juiz acolher apenas um deles, a apelação devolverá ao tribunal o conhecimento
dos demais. Não se faz necessária a reiteração dos fundamentos do pedido ou da
defesa. O que importa é hostilizar a decisão, a sentença, com a demonstração
dos errores em que incidiu e indicar
qual a dimensão do pedido de reforma. Qualquer fundamento constante da inicial
ou da contestação que tenha pertinência com a dimensão do pedido de reforma
poderá e deverá ser examinado pelo Tribunal, por força do efeito devolutivo.
Cabe, aqui, uma palavra sobre
a adição do parágrafo 3º ao artigo 515, por força da Lei nº 10.352, de 2001, parágrafo
esse que acolheu a teoria da causa madura para permitir ao tribunal o imediato
julgamento de mérito das ações em grau de recurso de apelação de sentença que
houvesse extinguido o processo sem resolução de mérito. Antes do advento desse
fragmento legal, o tribunal, em homenagem e acatamento à dimensão horizontal do
efeito devolutivo, somente considerava a pertinência da irresignação quanto à
matéria que conduzira o magistrado a extinguir o processo sem exame de mérito.
Se
desse provimento à apelação, deveria determinar o retorno dos autos à vara de
origem a fim de que o juiz do primeiro grau de jurisdição prosseguisse no exame
do feito e proferisse sentença de mérito. E assim fazia o tribunal para que a
parte não pudesse supressão de instância: o julgamento de mérito competiria
sempre aos juízes de primeiro grau , e
o juízo de revisão caberia aos tribunais. Com o novo § 3º do art.515, essa
perspectiva sofreu forte câmbio, com a permissão aos magistrados para
apreciação direta da matéria meritória, desde que a matéria processual, ou
eventual alegação de ausência de condições da ação (que funcionara para o
magistrado do primeiro grau como causa da extinção do processo sem julgamento
de mérito) tivesse sido superada pelo tribunal e a questão não comportasse mais
a necessidade de produção de provas, além da anteriormente realizada. Assim,
por exemplo, se tiver ocorrido a instrução probatória, com indicação das partes
em conflito de que não há mais provas a produzir, e o juiz vier a extinguir o
processo sem julgamento por ilegitimidade ativa para a causa, o tribunal
poderá, uma vez superada a questão da ilegitimidade, adentrar no exame de todas
as outras questões de mérito e julgar a demanda, sem considerar o fato de que o
juiz de primeiro grau ainda não o fizera.
É certo que essa nova
perspectiva sofreu algumas objeções doutrinárias, com a alegação de que o novo
preceito normativo padeceria de inconstitucionalidade por ofensa ao princípio
do duplo grau de jurisdição que informa o nosso direito processual. Penso que a
objeção não merece prosperar, porque o princípio invocado não é absoluto e
porque, de igual estatura constitucional (art. 5º, LXXVI), o princípio da
razoável duração do processo sustenta a constitucionalidade da inovação
introduzida no Código de Processo Civil, que deve primar pela efetividade, pela
pronta resposta jurisdicional ao cidadão que a requereu.
Com isso, o Código de
Processo Civil atende aos anseios da sociedade civil de maior efetividade na
entrega da prestação jurisdicional. No mesmo diapasão, é dado ao Tribunal de
Justiça ao verificar a ocorrência de nulidade sanável determinar a realização ou
renovação do ato processual; uma vez cumprida a diligência, e sempre que
possível, o tribunal prosseguirá no julgamento da apelação. Evidentemente, se
se tratar de nulidade insanável, não será possível a utilização desse
mecanismo.
No mesmo intuito de
privilegiar a efetividade processual, o legislador previu a possibilidade de se
alegar, em grau de apelação, matéria de fato que, por motivo de força maior não
tenha sido alegada perante o juízo de primeiro grau de jurisdição. Bem é de ver
que, em hipóteses dessa natureza, é possível imaginar mesmo a abertura de uma
instrução probatória perante o tribunal. Deveras, se é possível trazer questões
de fato ainda não alegadas, então há de ser possível sobre essas questões
produzir prova (qualquer espécie de prova), com a necessidade de abrir-se uma
fase de instrução no fluir do recurso de apelação. A colheita da prova será
dirigida pelo relator do recurso e por ele realizada pessoalmente, ou por meio
de carta de ordem para o juízo do primeiro grau da comarca em que a prova deva
ser produzida.
Bem é de ver que o § 1o do art. 518 do CPC impõe ao magistrado do primeiro grau de
jurisdição, em exame de admissibilidade, o dever de não receber o recurso de
apelação quando a sentença estiver em conformidade com súmula do Superior
Tribunal de Justiça ou do Supremo Tribunal Federal. Tem-se aqui, com novo
desenho, a ideia da súmula impeditiva de recurso, que frequentou várias versões
da PEC nº 29 (Reforma do Judiciário), mas que acabou abandonada na versão
final, que deu origem à Emenda Constitucional nº 45, de 2004. Reciclada, foi
apresentada ao Congresso Nacional como texto infralegal, com hospedagem
garantida no Código de Processo Civil. A tese central é a de que há uma espécie
de efeito vinculante das decisões dos dois tribunais de superposição capaz e
impedir o acesso da parte a qualquer outro órgão da jurisdição, desde que a
sentença proferida esteja na conformidade das súmulas desses tribunais. Dizendo
de outra forma, para que incida a norma consagrada nesse parágrafo, impõe-se
que a sentença esteja calçada em súmulas do STF e do STJ.
Não obstante a clareza do dispositivo, a
sua aplicação deve ser parcimoniosa. Não basta o amparo sumular. É necessário que
se verifique se o âmbito de incidência da súmula (material, pessoal, temporal,
espacial) encontra-se ajustado à questão de que trata a sentença. Quantas e
quantas vezes já não se viu algum órgão do Judiciário fazer inadequada eleição
da norma de regência da pretensão submetida a seu exame? Então, por que razão
deve ser afastada, prima facie, a
possibilidade de a mesma coisa acontecer com a aplicação da súmula? É bem
verdade que a ideia que informa a edição sumular é justamente a de aumentar o
coeficiente de densidade de certa norma jurídica e de reduzir as hesitações
sobre sua aplicabilidade. Isso não quer dizer, entretanto, que essas
dificuldades e hesitações desparecem por completo, quando por outro motivo não
seja, pela natural humanidade do prolator da decisão judicial.
É
importante, por isso, haver critério na aplicação do dispositivo ora em exame,
que criou esse novo pressuposto de (in)admissibilidade do recurso de apelação.
Cabe mais um apontamento a
respeito do tema. A concepção desse novo pressuposto tem de ser vista sob um
duplo aspecto: primeiro, objetiva privilegiar a jurisprudência das cortes de
superposição (o que era impositivo apenas com relação às súmulas vinculantes do
STF passa a ser impositivo para as partes com relação às súmulas do STF e do
STJ); segundo, visa a desafogar o trabalho dos tribunais do País, que, em tese,
passam a receber um número menor de recursos de apelação.
Justamente para atender a
esse desiderato, o legislador permitiu, a partir de 2006 (Lei nº 11.276) que o
juiz reexaminasse, em cinco dias, após a apresentação das contrarrazões de
apelação, os pressupostos de admissibilidade do recurso. Implica dizer, o
legislador conferiu ao magistrado o poder de, após advertido pela parte
recorrida, voltar atrás na decisão que admitiu o recurso para interditar a sua
progressão para o segundo grau de jurisdição.
Na
forma do disposto no art. 520, o recurso de apelação é recebido tanto no efeito
devolutivo quanto no suspensivo. Há, todavia, hipóteses expressamente previstas
naquele dispositivo, em que o recurso é recebido apenas no efeito devolutivo,
quando interposto de sentença que: homologar a divisão ou a
demarcação; II - condenar à prestação de alimentos; IV - decidir o processo
cautelar; V - rejeitar liminarmente embargos à execução ou julgá-los
improcedentes; VI - julgar procedente o pedido
de instituição de arbitragem. VII – confirmar a
antecipação dos efeitos da tutela.
Faltam:
Agravo, embargos infringentes, embargos de declaração.
RECURSO EXTRAORDINÁRIO
I.
Achegas Históricas
A história do Recurso extraordinário
está umbilicalmente ligada à História da instituição da República e da
Federação no Brasil. Deveras, ao copiarmos o modelo adotado pelos Estados
Unidos da América do Norte (e que já havia sido também adotado pela nossa
vizinha Argentina), trouxemos a idéia de uma Corte Federal, destinada à
preservação da Federação e da aplicação uniforme da lei federal em todo o
território nacional.
Nos Estados Unidos, a competência
recursal da Suprema Corte dava-se por meio da appellate jurisdicion, relativamente a certas causas que tivessem
sido julgadas pelos órgãos jurisdicionais de estatura inferior no âmbito da
União. No entanto, com o judiciary act
de 1789, atribuiu-se-lhe competência para rever as decisões (de última
instância) dos tribunais de justiça dos Estados, por meio do writ of error (que foi, após, rebatizado
de appeal pelo Judiciary act de 1925), quando o tema estivesse vinculado à constitucionalidade
das leis, à legitimidade das normas estaduais, aos títulos, direitos,
privilégios e isenções que tivessem pertinência com a Constituição e com os
tratados e leis da União. Além dessa possibilidade de revisão por meio do Writ of error, cogitava-se, também, da
utilização do certiorari, sendo
certo, porém, que, nessa hipótese, a Corte poderia ou não, em exercício
puramente discricionário (o que não acontecia em relação ao instituto
anterior). Esse último instituto acabou por prevalecer, sendo, hoje,
reconhecido, o claro poder da Corte de examinar ou não, quaisquer processos em
grau de apelo extremo, fulcrada no exercício do poder discricionário.
No
Brasil, já com o Decreto nº 510, de 22.06.1890, ainda sem o nome de recurso
extraordinário, verifica-se a inserção desse recurso no ordenamento jurídico
brasileiro (artigo 58, § 1º). Na mesma esteira, o Decreto nº 848, de
11.10.1890, que organizou a justiça federal brasileira, o adotou no artigo 9º,
parágrafo único[9].
A primeira Constituição da República,
de 24.02.1891, dispunha, no seu artigo 59:
Artigo 59. Ao Supremo Tribunal Federal
compete:
1. (omissis)
2. Julgar, em gráo de recurso, as
questões resolvidas pelos juizes e Tribunaes Federaes, assim como as de que
tratam o presente artigo, § 1º, e o artigo 60.
....
§ 1º Das sentenças das justiças dos
Estados em ultima instancia haverá recurso para o Supremo Tribunal Federal:
a) quando se questionar sobre a
validade ou a applicação de tratados e leis federaes, e a decisão do tribunal
do Estado for contra ella;
b) quando se contestar a validade de
leis ou de actos dos governos dos Estados em face da Constituição ou das leis
federaes, e a decisão do tribunal do Estado considerar validos esses actos, ou
essas leis impugnadas.[10] [11]
Observam-se, aí, hipóteses que coincidem
com o tema dos recursos extraordinários, quando se tratasse de decisão da
justiça dos Estados (as decisões da justiça federal eram julgadas em grau de
recurso ordinário), ainda sem a denominação, que somente vai ser adotada, em primeiro
lugar, com edição do primeiro regimento interno do Supremo Tribunal Federal, de
26 de fevereiro de 1891. Em termos de legislação ordinária, essa denominação
aparece no artigo 24 da Lei nº 221, de 1894, e, a partir daí, pode-se
considerar que foi consagrada.
Em
sede constitucional, a denominação aparece na Constituição de 1934, que trocou
a denominação do STF para Corte Suprema, e dispôs, no artigo 76:
Artigo 76. Á Corte Suprema Compete:
....
2. Julgar:
....
III. Em recurso extraordinario, as
causas decididas pelas justiças locaes em unica ou ultima instancia:
a) quando a
decisão for contra literal disposição de tratado ou lei federal, sobre cuja
aplicabilidade se haja questionado;
b) quando se
questionar sobre a vigência ou a validade de lei federal em face da
Constituição, e a decisão do tribunal local negar applicação á lei impugnada;
c) quando se
contestar a validade de lei ou acto dos governos locaes em face da
Constituição, ou de lei federal, e a decisão do tribunal local julgar valido o
acto ou a lei impugnado;
d) quando
occorrer diversidade de interpretação definitiva de lei federal entre Côrtes de
Appellação de Estados diferentes, inclusive do Districto Federal ou dos
Territórios, ou entre um destes tribunaes e a Côrte Suprema, ou outro tribunal
federal.
A Constituição de 1937 retornou à antiga
denominação (Supremo Tribunal Federal) e dispôs no artigo 101:
Artigo 101. Ao Supremo Tribunal Federal
compete:
III — julgar, em recurso extraordinário as
causas decididas pelas justiças locais em única ou última instância:
a) quando a
decisão for contra a letra de tratado ou lei federal, sobre cuja aplicação se
haja questionado;
b) quando se
questionar sobre a vigência ou validade de lei federal em face da Constituição
e a decisão do tribunal local negar aplicação à lei impugnada;
c) quando se
contestar a validade de lei ou ato dos governos locais em face da Constituição
ou de lei federal, e a decisão do tribunal local julgar válida a lei ou o ato
impugnado;
d) quando
decisões definitivas dos Tribunais de Apelação de Estado diferentes, inclusive
do Distrito Federal ou dos Territórios, ou decisões definitivas de um dêstes
Tribunais e do Supremo Tribunal Federal derem à mesma lei federal inteligência
diversa.
A
Constituição de 1946 inovou (sem que isso tenha tido repercussão na
jurisprudência pátria como se verá no momento oportuno), ao dispor, no artigo
101, de forma apenas parcialmente semelhante:
Artigo 101. Ao Supremo Tribunal Federal
compete:
....
III — jogar em recurso extraordinário
as causas decididas em única ou última instância por outros tribunais ou
juízes:
a) quando a
decisão for contrária a dispositivo desta Constituição a letra de tratado ou
lei federal;
b) quando se
questionar sobre a validade de lei federal em face desta Constituição, e a
decisão recorrida negar aplicação à lei impugnada;
c) quando se
contestar a validade de lei ou ato de governo local em face desta Constituição
ou de lei federal, e a decisão recorrida julgar válida a lei ou o ato;
d) quando na
decisão recorrida a interpretação da lei federal invocada fôr diversa da que
lhe haja dado qualquer dos outros tribunais ou o próprio Supremo Tribunal
Federal.
A
Constituição de 1967 dispôs:
Art 114 - Compete ao
Supremo Tribunal Federal:
....
III
- julgar, mediante recurso extraordinário, as causas decididas, em única ou
última instância, por outros Tribunais, quando a decisão recorrida:
b)
declarar a inconstitucionalidade de tratado ou lei federal;
c)
julgar válida lei ou ato do Governo local, contestado em face da Constituição
ou de lei federal;
d)
dar à lei federal interpretação divergente da que lhe haja dado outro Tribunal
ou o próprio Supremo Tribunal.
A
Emenda Constitucional nº 1 de 1969 não inovou na matéria, dispondo, no artigo
119:
Artigo 119. Compete ao
Supremo Tribunal Federal:
.......
III - julgar,
mediante recurso extraordinário, as causas decididas em única ou última
instância por outros tribunais, quando a decisão recorrida:
a) contrariar
dispositivo desta Constituição ou negar vigência de tratado ou lei federal;
b) declarar a
inconstitucionalidade de tratado ou lei federal;
c) julgar válida
lei ou ato do govêrno local contestado em face da Constituição ou de lei
federal; ou
d) der à lei
federal interpretação divergente da que lhe tenha dado outro Tribunal ou o
próprio Supremo Tribunal Federal.
Finalmente, a Constituição de 1988, já
com a redação da Emenda Constitucional nº 45, estabeleceu:
Artigo 102. Compete ao Supremo Tribunal
Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe:
..........
III - julgar, mediante recurso
extraordinário, as causas decididas em única ou última instância, quando a
decisão recorrida:
É esse o regramento constitucional
positivo que informa o exame que passa a ser feito sobre o recurso
extraordinário.
II. A natureza do recurso
extraordinário
Como resulta do rápido apanhado
histórico que se fez, o nosso recurso extraordinário tem origem no writ of error e no certiorari norte-americanos, e tem como objetivo a preservação da
supremacia da constituição e da unidade da federação. Costuma-se dizer, nesse
sentido, que o recurso extraordinário não é um recurso com função precípua de
realização da justiça. É claro, o cidadão, quando avia o seu recurso
extraordinário, normalmente não se preocupa com as mazelas que uma lesão pode
causar à Carta Política. O seu objetivo mais imediato e a suposta reparação de
um direito subjetivo eventualmente desrespeitado. Para o Estado, entretanto, o
que está em jogo são outros valores objetivamente considerados, de natureza
constitucional e que visam à própria preservação do Estado e da estrutura para
ele preconizada pelo poder constituinte.
Bem
examinado, o recurso extraordinário prestava-se a funcionar como último elo da
cadeia de controle de constitucionalidade por via incidental, isto é, da
técnica de controle em que o bem da vida perseguido pelas partes tinha como
pressuposto o reconhecimento (incidenter
tantum) de que determinada norma legal era compatível ou incompatível com o
texto constitucional que estivesse vigendo. A decisão proferida no recurso
extraordinário, entretanto, somente fazia coisa julgada em relação às partes.
Como,
todavia, o raciocínio disseminado no seio da advocacia (e da sociedade leiga)
não percebia as qualidades e especificidades do recurso extraordinário,
rapidamente passou-se a acreditar que ele constituiria uma espécie de terceiro
grau de jurisdição a que todos deveriam ter acesso, máxime porque, diversamente
do que acontecera no direito norte-americano — que se baseara também no certiorari, por meio do qual era
pacificamente admitido o poder discricionário da Suprema Corte para deliberar
se iria ou não examinar determinado pedido de revisão —, no direito brasileiro,
o entendimento era o de que havia um direito absoluto ao recurso, desde que
atendidos os pressupostos previstos nas diversas constituições
republicanas.
É
certo que as três primeiras constituições republicanas deixavam bastante
evidenciado que seria necessário, para que o cidadão tivesse acesso ao Supremo
Tribunal Federal, que a matéria teria pertinência com a letra de tratado ou lei federal sobre cuja aplicação se houvesse
questionado.
Passou-se a ter como certo que, além
dos pressupostos e requisitos genéricos, i.e., comuns a todos os recursos, o
extraordinário, até por inserir-se na categoria dos recursos de fundamentação
vinculada, teria pressupostos específicos, dentre os quais avultava o do
questionamento (após, prequestionamento), na instância da qual se recorria, da
aplicabilidade do tratado ou lei federal. Mais: considerava-se ocorrido o
prequestionamento quando tivesse havido debate sobre o tema no âmbito do
colégio julgador. Não bastava que a matéria tivesse sido simplesmente apontada
no recurso de apelação pela parte interessada. Era necessário que sobre ela o
tribunal se houvesse pronunciado.
Ocorre que essa
exigência deixou de ter assento constitucional desde a Constituição de 1946.
Dizendo de outra forma, a partir de 1946 não seria mais possível ao Supremo
Tribunal Federal exigir o requisito do prequestionamento. Parcela da doutrina tenta sustentar que o requisito do
prequestionamento está mantido por força da expressão “causas decididas” que consta no inciso III do artigo 102. O
argumento vale zero. A uma porque de causas decididas não se pode, nem por
larga concessão hermenêutica inferir a necessidade do prequestionamento. Causas
decididas quer dizer causas em que houve deliberação judicial. A duas porque as
constituições de 1934 e 1937 possuíam nos incisos III dos arts. 76 e 101,
respectivamente, a mesma expressão “causas
decididas”, mas, nas alíneas “a”
havia a exigência de que tivesse havido questionamento sobre a matéria federal.
Dizendo de forma bem clara: a exigência do questionamento sempre esteve lançada
na alínea “a” e não na cabeça do
inciso dessas constituições.
Quando o legislador
constituinte efetuou a modificação na redação das alíneas “a” dos textos constitucionais subsequentes (ressalvada a hipótese
de cochilo do constituinte, o que não se pode presumir) fê-lo porque entendeu
necessário mudar o sistema. Se antes o exigia, depois deixou de fazê-lo.
Sem embargo da clara
modificação constitucional, o Supremo Tribunal Federal continuou a exigir o
requisito do prequestionamento, chegando a editar a súmula nº 282, dispondo que
é inadmissível o recurso extraordinário, quando não ventilada, na decisão
recorrida, a questão federal suscitada. Ora, com certeza, a edição da súmula em
questão, que não homenageia o direito constitucional brasileiro, ocorreu como
forma de impedir que o STF sucumbisse literalmente sobre o peso dos recursos
que desabariam sobre ele após a supressão da exigência constitucional do
prequestionamento. Assim, a medida preconizada na súmula atende muito mais à
necessidade de construção de uma jurisprudência
defensiva (como tem sido apelidado esse fenômeno) do Supremo Tribunal Federal
do que propriamente ao direito que passou a vigorar com a Constituição de 1946.
Com ela, o STF corrigiu o fato de que nossa cultura não havia importado a
discricionariedade na admissão dos recursos extraordinários (para se ter uma ideia,
em apenas dois anos --2004/2005 – o Supremo Tribunal Federal recebeu em seu
protocolo um número de processos superior a todos os que foram julgados pela
Suprema Corte norte-americana em toda a sua história.).
Daí em diante, e sem embargo
de nenhuma constituição brasileira ter repetido a exigido o prequestionamento,
permaneceu inalterado o posicionamento da Corte quanto a esse requisito. É bem
verdade que outros mecanismos constitucionais foram criados visando a dar ao
Supremo Tribunal Federal outras formas de exercer o poder discricionário sobre
a subida de recursos extraordinários de modo a permitir que o STF continuasse
funcionando. Deveras, a Emenda Constitucional nº 1 de 1969 dispôs no parágrafo
único do artigo 119 que as causas a que se refere o item III, alíneas “a” e “d”
deste artigo serão indicadas pelo Supremo Tribunal Federal no regimento
interno, que atenderá à sua natureza, espécie ou valor pecuniário. E,
realmente, o Regimento Interno, desde 1970, passou a prever no artigo 308
hipóteses nas quais não se admitia o cabimento do recurso extraordinário,
sempre ressalvando que essas limitações que criara não incidiriam quando se
tratasse de ofensa à Constituição ou discrepância da decisão recorrida com a
assim chamada jurisprudência dominante da casa. Logo após, em 1975, com a
Emenda Regimental nº 3, o STF alterou o artigo 308 do seu Regimento para adotar
a chamada argüição de relevância da questão federal em substituição à formula
exceptiva que acaba de ser mencionada[12].
A arguição de relevância passou a ser
considerada como um requisito de admissibilidade do recurso extraordinário,
sendo, nas palavras do Ministro Vitor Nunes Leal, a melhor forma de aliviar a
sobrecarga de trabalho em que se encontrava o STF[13].
Percebe-se que a arguição era uma tentativa de aproximar o Recurso
Extraordinário de seu símile norte-americano, dando-lhe dignidade e estatura de
sorte que o STF pudesse preocupar-se somente com aquelas questões que
considerasse realmente importantes ou significativas para justificar uma
revisão.
Procedimentalmente, a arguição era
ofertada na própria petição de recurso extraordinário, em capítulo destacado
daquele em que se apresentavam as razões do recurso propriamente dito e nelas a
parte buscava superar os óbices regimentais, expondo as razões por que entendia
que naquele específico caso estariam presentes elementos de natureza jurídica,
social, etc., que extrapassariam os lindes da causa, a sugerir a necessidade de
deliberação da Corte maior.
Ocioso lembrar que o
instituto foi objeto de críticas porque a relevância, tal como concebida, de
forma discricionária, poderia conduzir ao arbítrio por parte dos Juízes da
Corte, ou no sentido de que a relevância é um dado axiológico que deve ser
ponderado pelo legislador ao momento da edição da norma jurídica primária e não
pelo julgador, ao momento de sua aplicação. Ora, a idéia da discricionariedade
em relação à admissão do RE é justamente fundada no fato de que um cidadão tem
direito a um duplo grau de jurisdição, não mais do que isso. Não há um terceiro
ou quarto grau de jurisdição. Ao depois, dizer que ponderações axiológicas são
prerrogativa do legislador e não do aplicador da lei é afirmação destituída de
qualquer fundamento lógico. Ao contrário, não se pode conceber a adequada
aplicação da norma jurídica sem considerar a sua dimensão axiológica.
Vale lembrar que, não
obstante a defesa que fazemos da arguição de relevância, o fato é que, talvez
por se tratar de instituto nascido na época da ditadura militar, a Constituição
de 1988 não acolheu esse requisito de admissibilidade, com o que o Supremo
Tribunal deixou de contar com o filtro de que dispunha para selecionar as
demandas a examinar, o que teve como consectário natural o aumento da carga de
recursos extraordinários em condições de ir a julgamento (independentemente de
o STF continuar utilizando aquele malsinado critério do prequestionamento.)
Nem
por outro motivo, a Emenda Constitucional nº 45 reinseriu na Carta Política
outra e necessária forma de filtro, por meio do qual o recorrente deverá demonstrar a repercussão geral das questões
constitucionais discutidas no caso, nos termos da lei, a fim de que o Tribunal
examine a admissão do recurso, somente podendo recusá-lo pela manifestação de
dois terços de seus membros.
Semelhantemente
à arguição de relevância, a repercussão geral é um pressuposto específico de
admissibilidade do Recurso extraordinário, cujo exame compete exclusivamente ao
STF, diferentemente do que acontece com os demais pressupostos de
admissibilidade, que podem ser valorados pelo presidente ou vice-presidente do
tribunal a quo. Certamente que a
doutrina será capaz de encontrar formas distintivas entre um instituto e outro
(um é includente; outro, excludente. Um tem presumida a existência; outro, a
inexistência, etc.), mas, na essência, são a mesma coisa. As diferenças são
mais pertinentes ao procedimento da repercussão geral, que será examinado mais
à frente.
Adicione-se
a isso o instituto da súmula vinculante -- recém-inserido no ordenamento
constitucional brasileiro --, que tem conexão com a atividade do STF relativa
ao julgamento dos recursos extraordinários e se terá uma nova configuração do
recurso extraordinário: cada vez mais o RE deixa de ser o último elo na cadeia
do controle de constitucionalidade incidental para se tornar mais um
instrumento de controle in abstracto de
constitucionalidade naquilo que já vem sendo chamado, não sem razão, de objetivação do recurso extraordinário,
numa evidente alusão ao fato de que o controle abstrato de constitucionalidade
se faz por meio de processos objetivos, não de partes.
Hipóteses de cabimento
Com
o advento da Constituição de 1988, houve o desdobramento do recurso
extraordinário em recurso extraordinário e recurso especial, numa espécie (que
não chega a ser inusitada) de divisão de competência funcional, em que dois
órgãos da jurisdição são chamados a examinar diferentes matérias num mesmo
processo. Ao STF coube o exame da matéria de natureza constitucional. Ao então
criado Superior Tribunal de Justiça coube a última palavra sobre juízos de
legalidade e sobre a uniformização do entendimento sobre o direito federal.
Volta-se
à redação do artigo 102, III, da Constituição em vigor, agora para exame das
hipóteses em que cabe o recurso extraordinário:
Artigo 102. Compete ao Supremo Tribunal
Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe:
..........
III - julgar, mediante recurso extraordinário, as causas decididas em
única ou última instância, quando a decisão recorrida:
a) contrariar dispositivo desta Constituição;
b) declarar a inconstitucionalidade de tratado ou lei federal;
c) julgar válida lei ou ato de governo local contestado em face desta
Constituição.
d) julgar válida lei local contestada em face de lei federal.
A
alínea “a” como todas as outras, somente
pode ser interpretada em perfeita harmonia com a cabeça do inciso III. Para
caber recurso extraordinário é necessário que se trate de decisão de única ou
última instância, isto é, no sentido de que tenha sido esgotada a instância
ordinária, i.e., no sentido de que
não caiba mais nenhum outro recurso. Somente porque esgotada a instância
ordinária e que pode ser aberto o acesso à extraordinária. Vale o registro de
que, diferentemente do que acontece em relação ao recurso especial, que somente
é cabível de decisões de tribunais de justiça e de tribunais regionais federais
(órgãos do segundo grau de jurisdição), é possível que seja aberta a via do
extraordinário diretamente a partir do primeiro grau de jurisdição. Dizendo de
outra forma, é cabível recurso extraordinário contra decisão de juiz de
primeiro grau, bastando, para isso, que não haja previsão de recurso para o
segundo grau, de que são exemplos a sentença de que cogita o artigo 34 da Lei
nº 6.830, de 1980, que trata do executivo fiscal, e as decisões proferidas nos
juizados especiais examinadas pelas turmas recursais, que não são órgãos de
segundo grau de jurisdição.
Assim,
para efeito da redação do inciso III, causas decididas em única ou última
instância são causas a cujo respeito não se pode mais falar em recorribilidade
ordinária. Não por outro motivo, essa matéria foi objeto da Súmula nº 281 do
STF, que dispõe que é inadmissível o recurso extraordinário, quando couber, na
justiça de origem, recurso ordinário da decisão impugnada.
A
abertura da vereda extraordinária supõe, pois, a estabilização da moldura
fática do processo, a respeito da qual não se permitirá revolvimento. Tem sido
dito em doutrina que o STF não examina matéria de fato, no julgamento de RE,
mas apenas e tão-somente matéria de direito. É difícil fazer esse discrímen
entre questão de fato e questão de direito principalmente para os que se filiam
ao entendimento de que o Direito é, a um só tempo, fato-norma-valor, como
preconizado pela teoria tridimensional do Direito. O que talvez se queira dizer
é que no STF não se reexaminam provas, matéria afeta exclusivamente à instância
ordinária.
Não
cabem no conceito de causa, para fins de abertura da via excepcional,
atividades praticadas nas instâncias ordinárias que não sejam de natureza
jurisdicional, tais assim os processos meramente administrativos, como, v.g.,
os processamentos de precatórios em decorrência de execuções contra a fazenda
pública, ou as decisões que julgam procedentes pedidos de intervenção federal.
Vale
o registro lateral de que, desde 2001, com o advento da Lei nº 10.532, se o
acórdão ordinário contiver parte unânime e parte não-unânime, o recurso
extraordinário ou especial somente será possível após o processamento e
julgamento dos embargos infringentes, ou quando houver transitado em julgado a
parte não-unânime do acórdão, conforme agora dispõe o artigo 498, e seu
parágrafo único, do Código de Processo Civil.
Cabimento do recurso
extraordinário pela alínea “a”
Para
que caiba o recurso pela alínea “a” é necessário que o acórdão recorrido tenha,
ao menos, interpretado o dispositivo constitucional de forma equivocada,
aplicando-o de forma inexata. É que contrariar significa uma forma de ofensa à
Constituição, aplicando o fragmento constitucional a uma hipótese em que ela
não poderia incidir ou deixando de aplicá-lo a uma situação em que ele deveria
ter incidido, ou, ainda, aplicando-o a uma hipótese em que realmente deveria
incidir, mas o fazendo de forma inadequada, por força de interpretação errônea,
retirando dele conclusões que seriam inextraíveis.
Durante
muito tempo, o STF teve dificuldades em separar, com relação à alínea “a”, o
juízo de admissibilidade do juízo de mérito. O STF ou (i) não conhecia o
recurso, ou; (ii) dele conhecida e lhe dava provimento. Não era capaz a Corte
de conhecer de um recurso pela aliena “a”, mas negar-lhe provimento. Isso, por
certo, tinha efeitos práticos de enorme repercussão, sobretudo no âmbito das
ações rescisórias. Somente a partir de agosto de 2003, o STF modificou o posicionamento
e passou a distinguir o juízo de admissibilidade do recurso — para o qual é
suficiente que o recorrente alegue adequadamente a contrariedade pelo acórdão
recorrido de dispositivos da Constituição nele prequestionados — e juízo de
mérito, que envolve a verificação de compatibilidade ou não entre a decisão
recorrida e a Constituição (STF-Pleno: RF- 370/280). Com o novo posicionamento,
todas as alíneas do inciso III passam a ter o mesmo conteúdo axiológico.
Cabe
o registro de que a expressão “contrariar dispositivo desta constituição”,
supõe que a contrariedade seja frontal e direta. Não se admite a contrariedade
por via reflexa, assim considerada aquela que envolve, para sua demonstração, a
interposição de algum raciocínio fulcrado em lei infraconstitucional.
Cabimento do recurso
extraordinário pela alínea b
No
que concerne à alínea “b”, a Constituição dispõe que cabe recurso
extraordinário da decisão de última ou única instância que declarar a
inconstitucionalidade de tratado ou lei federal. Importante destacar, a esse respeito, que, em
homenagem ao disposto no artigo 97 do Texto constitucional, somente por maioria
absoluta de seus membros ou dos membros do respectivo órgão especial poderão os
tribunais declarar a inconstitucionalidade de lei ou de ato normativo do poder
público.
Existe
aí uma espécie de divisão de competência funcional. Deveras, um recurso de
apelação é julgado numa turma ou câmara, pelo voto de três desembargadores. Se
estes, no julgamento da apelação, acolherem a arguição de inconstitucionalidade
feita de maneira incidente, lavram o acórdão e determinam a remessa da questão
ao tribunal pleno ou ao órgão especial. Este delibera exclusivamente sobre a
(in)constitucionalidade e determina o retorno dos autos ao órgão fracionário
para que prossiga no julgamento do recurso de apelação. É importante deixar
claro que a decisão que enseja o recurso extraordinário não é a do tribunal
pleno ou do órgão especial que resolve o incidente de inconstitucionalidade,
mas sim aquela, da turma, que completa, que conclui o julgamento do feito (a
teor do disposto na súmula nº 513 do STF).
Convém
aduzir, quanto ao tema que, em boa hora o legislador infraconstitucional fez
inserir um parágrafo único no artigo 481 do Código de Processo Civil, estabelecendo
que os órgãos fracionários dos tribunais não submeterão ao plenário ou ao órgão
especial, a arguição de inconstitucionalidade, quando já houver pronunciamento
destes ou do plenário do Supremo Tribunal Federal sobre a questão. É só essa,
entretanto, a exceção possível. Em qualquer outra circunstância a matéria deve
ser submetida ao colegiado maior. Não se admite a utilização de subterfúgios
pelos órgãos da jurisdição ordinária com o objetivo de furtar-se ao cumprimento
do artigo 97 do texto constitucional. Não por outro motivo, o Supremo Tribunal
Federal fez editar a Súmula Vinculante nº 10, dispondo que “viola a cláusula de
reserva de plenário (CF, artigo 97) a decisão de órgão fracionário de Tribunal
que, embora não declare expressamente a inconstitucionalidade de lei ou de ato
normativo do poder público, afasta a sua incidência no todo ou em parte.”
Aduza-se
que se o acórdão recorrido (aquele que completou o julgamento do recurso de
apelação) não estiver acompanhado da decisão proferida pelo plenário ou pela
corte especial, será de todo conveniente a oposição de embargos de declaração
para que, suprida a omissão, possa ser levada ao conhecimento da Corte Maior a
argumentação desenvolvida pelo tribunal recorrido quando do julgamento do incidente
de inconstitucionalidade.
Cabimento do recurso
extraordinário pelas alíneas “c” e “d”
Quanto
ao cabimento pela aliena “c”, a Constituição dispõe que será possível a
interposição de recurso extraordinário sempre que a decisão proferida pelo
Tribunal a quo “julgar válida lei ou ato de governo local contestado em face
desta constituição.”
Na
Constituição de 1969 essa previsão constava no artigo 119, III, c, com redação
algo diversa, dado que o recurso cabia contra decisão que julgasse “válida lei
ou ato de governo local contestado em face da Constituição ou de lei federal.”
Com
a criação do STJ houve uma cisão dessa hipótese, sendo remetida a competência
do exame da validade de lei ou ato de governo local contestado em face de lei
federal para aquele novo Tribunal. Permaneceu com o STF apenas a possível lesão
perpetrada por lei ou ato de governo local constestado em face da Constituição.
Posteriormente
percebeu-se que uma das hipóteses remetidas ao STJ implicava, na generalidade
dos casos, a existência de questão constitucional, razão por que a Emenda
Constitucional nº 45 fez incluir a alínea “d” no inciso III do artigo 102 (julgar
válida lei local contestada em face de lei federal), justamente porque aí
aparece a possibilidade de invasão de competência legiferante de uma esfera da
Federação relativamente a outra esfera. Isso, em tese, constitui uma questão constitucional a ser dirimida pelo Supremo
Tribunal Federal.
Hipóteses de cabimento do recurso especial
No
que concerne ao cabimento do recurso especial, convém retomar a afirmação de
que este, diversamente do que ocorre como recurso extraordinário, somente pode
ser tirado de decisão proferida por órgãos colegiados dos Tribunais de Justiça
dos Estados e do Distrito Federal ou dos Tribunais Regionais Federais. Não cabe,
pois, nem de decisão monocrática de desembargadores desses tribunais (o interessado
há sempre de provocar a prolação de um órgão colegiado), nem, muito menos, de
juízes do primeiro grau de jurisdição ou de turmas recursais dos juizados
especiais, que não são órgãos do segundo grau.
Cabimento pela alínea “a”
Dispõe o art. 105, III, “a”, da
Constituição que cabe recurso especial das decisões dos tribunais (antes
mencionados) quando a decisão recorrida contrariar tratado ou lei federal ou
negar-lhes vigência. O parâmetro de aferição é sempre a lei federal (o tratado
de que trata o fragmento constitucional é aquele que foi incorporado ao nosso
direito interno), assim considerada aquela produzida pelo Poder Legislativo da
União (Leis Complementares, Leis Ordinárias, Leis Delegadas, Decretos e
Regulamentos Federais), e a medida provisória ainda que pendente de apreciação
pelo Parlamento. Outros atos normativos, de natureza estadual ou municipal não
ensejam a abertura da via especial. Mesmo aqueles provenientes de órgão federal,
mas que não caibam em uma das espécies antes enunciadas, como as portarias, instruções,
ordens de serviços, regimentos internos de tribunais, não ensejam o cabimento do
recurso especial.
Para que seja cabível o recurso
especial é necessária a demonstração, em tese, da ofensa, da contrariedade, a
uma dessas espécies de norma. Contrariar, aqui, tem o mesmo sentido atribuído à
alínea “a’, do inciso III, do art. 102, da Constituição. Há contrariedade quando se aplica a norma a uma situação
que escapa ao seu âmbito de vigência (material, pessoal, espacial ou temporal),
ou se não a aplica a uma situação em que ele deveria incidir; ou ainda, quando
se a aplica a uma situação por ela abrangida, mas daí retirando consequências não
previstas e não pretendidas para a espécie.
É
bem de ver que o STJ se fez herdeiro de várias súmulas do STF (de algumas fez cópias
com numeração própria), que possuem caráter didático quanto ao não-cabimento do
recurso especial. Assim, por exemplo, editou a súmula nº 5, para afirmar que “A
simples interpretação de cláusula contratual não enseja recurso especial”. Quer
isso significar que não se trata de um novo recurso de apelação e sim de uma
via de acesso à instância de superposição com o objetivo de preservar a higidez
do direito federal. Sem embargo disso, o STJ tem afirmado, corretamente, que a
análise jurídica da legalidade de cláusula contratual não se confunde com
reexame do contrato. Este não admite a abertura da via excepcional; aquela, sim.
Também a súmula nº 7 ingressa nesse mesmo espaço para afirmar que “A pretensão
de simples reexame de prova não enseja recurso especial”. A instância de superposição
recebe a moldura fática tal como estabilizada no julgamento pelos tribunais ordinários
e não se presta a reexaminar a prova produzida. Sem embargo disso, o STJ tem
admitido distinguir reexame e revaloração da prova, o primeiro inadmitido e o
segundo admitido em sede de recurso especial. Neste último caso, o que normalmente
é um erro de percepção sobre algum preceito de natureza processual ou substancial
que, se houvesse sido observado, ensejaria ao magistrado qualificar a mesma
prova produzida para atribuir-lhe valor diverso daquele que emprestou.
Alínea
b. Falta
Alínea
c. Falta
Procedimento
Com
relação ao procedimento, não há hesitações doutrinárias de monta. O simples
acesso ao texto do Código de Processo Civil resolve a generalidade das
questões. Reproduzem-se, a seguir, os dispositivos reitores da matéria, com
breves comentários:
Art. 541. O recurso extraordinário e o
recurso especial, nos casos previstos na Constituição Federal, serão
interpostos perante o presidente ou o vice-presidente do tribunal recorrido, em
petições distintas, que conterão:
I - a exposição do fato e do direito;
Il - a demonstração do cabimento do recurso interposto;
III - as razões do pedido de reforma da decisão recorrida.
Parágrafo único. Quando o recurso
fundar-se em dissídio jurisprudencial, o recorrente fará a prova da divergência
mediante certidão, cópia autenticada ou pela citação do repositório de
jurisprudência, oficial ou credenciado, inclusive em mídia eletrônica, em que
tiver sido publicada a decisão divergente, ou ainda pela reprodução de julgado
disponível na Internet, com indicação da respectiva fonte, mencionando, em
qualquer caso, as circunstâncias que identifiquem ou assemelhem os casos
confrontados.
Cabe, aqui, a anotação de que
o recurso extraordinário e o recurso especial são recursos formais, que hão de
atender aos requisitos a eles impostos pela Constituição e pela lei processual.
Além das normas primárias, há ainda um verdadeiro rosário de súmulas
vinculantes e persuasórias, no âmbito do STF e do STJ, que devem ser levadas em
consideração ao momento da interposição do recurso (ao final do texto há um
apêndice com as principais súmulas aplicáveis à matéria).
Se for o caso de interposição de recurso
extraordinário e especial, é necessário que se valha o recorrente de duas
petições distintas, uma para cada recurso. Se assim, não proceder, a conclusão
pode ser a de que ambos não atendem ao requisito da regularidade formal, o que
gerará sua inadmissibilidade. Há, registre-se, solução menos radical, admitindo
o conhecimento de recurso especial tirado na mesma peça do extraordinário.
Dentro
do tema, convém recordar que algumas vezes é impositiva a interposição de ambos
os recursos, não cabendo escolha ao recorrente. Deveras, há ocasiões em que o
acórdão a ser recorrido contém fundamentos de natureza legal e de natureza
constitucional, cada um dos quais apto, por si só, a sustentar as conclusões do
Tribunal ordinário. Nessas circunstâncias, o recorrente deve dar notícia de que
está a aviar ambas as interposições, sob pena de ver os recursos não admitidos,
sob o argumento da falta de interesse de recorrer, como, aliás, está
expressamente previsto na Súmula nº 126.
Questão
interessante que pode ser colocada a esse respeito decorre da Emenda
Constitucional nº 45 que, como já sabido, criou o requisito da repercussão
geral para fins de admissibilidade do Recurso Extraordinário. Não admitida a
existência da repercussão geral, o recurso extraordinário não será conhecido,
independentemente de a questão meritória poder indicar verdadeira violação
constitucional (nem se chega a esse exame). A questão que se coloca é que,
assim, em primeira análise, ou bem se impõe à parte o dever de interpor o RE
mesmo com a consciência de que o recurso não será conhecido (dado que a decisão
de não-conhecimento do RE é estendida a todos os outros recursos que tratem da mesma
matéria) ou se está a estender, por enquanto de forma indevida, o instituto da
repercussão geral também para o recurso especial, porquanto esse também não será
conhecido, por força da aplicação da súmula 126, de a parte não interpuser o
inviável RE.
É
importante destacar, também, a necessidade da inteireza do texto recursal no
sentido de que o relator, na instância de superposição, deve ter condições de
compreender a controvérsia constitucional ou legal sem necessidade de recorrer
a qualquer outra peça dos autos (ele não fará a você o favor de compulsar
outras peças dos autos antes de exercer um juízo positivo de admissibilidade).
Deve-se,
por isso, abrir uma epígrafe, talvez com a sugestiva expressão “para
compreender a controvérsia” em que o recorrente possa estabelecer a verdade dos
fatos, tal qual admitida nas instâncias ordinárias e, com base nessa moldura,
demonstrar em que consiste a lesão constitucional ou legal, ou o dissenso
jurisprudencial.
A
propósito desse último aspecto, e se essa for a hipótese de cabimento
sustentada pelo recorrente, é igualmente fundamental que seja aberta outra
epígrafe nas razões de recurso, que pode ser nominada cotejo analítico, em que deve ser demonstrada a similitude das
molduras fáticas (acórdão paradigma acórdão recorrido) e a dessemelhança das
teses jurídicas adotadas em ambos os casos. Não basta, advirta-se, reproduzir
as respectivas ementas; é necessário que sejam reproduzidos trechos do voto
paradigma e do recorrido que sejam aptos à demonstração da indicada similitude.
Desnecessário
dizer que o recorrente, nessa hipótese, deverá trazer aos autos o acórdão
divergente, e dele dar conhecimento ao tribunal por uma das formas admitidas no
parágrafo único do art. 541, do CPC. E art. 255 do Regimento Interno do STJ.
Art. 542. Recebida a petição pela
secretaria do tribunal, será intimado o recorrido, abrindo-se-lhe vista, para
apresentar contrarrazões.
§ 1o Findo esse prazo, serão os autos conclusos para admissão
ou não do recurso, no prazo de 15 (quinze) dias, em decisão fundamentada.
§ 3o O recurso extraordinário, ou o recurso
especial, quando interpostos contra decisão interlocutória em processo de
conhecimento, cautelar, ou embargos à execução ficará retido nos autos e
somente será processado se o reiterar a parte, no prazo para a interposição do
recurso contra a decisão final, ou para as contrarrazões.
O procedimento foi simplificado em relação
à redação original do Código de 1973. A petição de recurso, agora, já cuida do
cabimento e das razões de recurso. Da mesma forma, as contrarrazões atacam, de
uma só vez, o cabimento e as razões do mérito recursal. Processado, com as
contrarrazões eventualmente ofertadas, o recurso é encaminhado ao presidente ou
vice-presidente do tribunal ordinário para que exerça o primeiro juízo de
admissibilidade, com o exame dos pressupostos gerais e específicos do recurso,
com a advertência de que, relativamente ao pressuposto da repercussão geral, o
desembargador examina apenas do ponto de vista formal se o requerente
apresentou a correspondente arguição. Fica-lhe interditada, entretanto,
qualquer avaliação sobre se realmente ocorre ou não a repercussão geral, matéria
afeta exclusivamente ao crivo do STF.
Embora
a legislação brasileira esclareça que os recursos extraordinário e especial
possuem apenas efeito devolutivo, não têm sido poucas as investidas práticas no
sentido da consecução do efeito suspensivo, muitas dessas revestidas de êxito. Deveras,
durante largo período da história recente do STF e do STJ, era usual a
concessão de efeito suspensivo aos recursos extraordinário e especial por parte
dessas cortes, já em decorrência da formulação de pedidos específicos, já em
decorrência de ações cautelares com essa finalidade. Provavelmente em
decorrência de excessos cometidos na busca desse efeito, os tribunais
superiores ficaram infestados de pedidos com essa finalidade o que acabou
gerando a edição das súmulas 634 e 635 do STF, vedando a postulação de
providências desse jaez no âmbito do STF e remetendo a apreciação de pedidos
dessa natureza aos tribunais ordinários, ao arrepio, diga-se de passagem, da
norma contida no art. 800, parágrafo único, que dispõe sobre a imediata
transferência para o tribunal recorrida, da competência para apreciar pedido de
liminar, uma vez interposto o recurso. É certo que, aqui, o argumento do STF,
ao editar as súmulas restritivas, há de fundar-se no fato de que a sua
competência é inextensível por meio de lei ordinária.
O
parágrafo terceiro do art. 542 criou uma modalidade de recurso extraordinário e
especial retido nos autos, quando interpostos contra decisão interlocutória em
processo de conhecimento, cautelar, ou embargos à execução. A criação deve-se à
necessidade de racionalizar o trabalho processual nas cortes superiores. Em vez
de, no curso do processo nas instâncias ordinárias, conferir trânsito para as
extraordinárias com vistas ao exame de uma decisão interlocutória por alegada
violação legal ou constitucional, determina que ele permaneça nos autos para
ser julgado somente quando do julgamento do recurso excepcional tirado da última
decisão proferida no tribunal ordinário, isso se a parte interessada reiterar a
pretensão recursal até o momento não apreciada, ou em razões de recurso, ou em
contrarrazões .
Art. 543. Admitidos ambos os recursos,
os autos serão remetidos ao Superior Tribunal de Justiça.
§ 1o Concluído o julgamento do recurso especial, serão os
autos remetidos ao Supremo Tribunal Federal, para apreciação do recurso
extraordinário, se este não estiver prejudicado.
§ 2o Na hipótese de o relator do recurso especial considerar
que o recurso extraordinário é prejudicial àquele, em decisão irrecorrível
sobrestará o seu julgamento e remeterá os autos ao Supremo Tribunal Federal,
para o julgamento do recurso extraordinário.
§ 3o No caso do parágrafo anterior, se o relator do recurso
extraordinário, em decisão irrecorrível, não o considerar prejudicial,
devolverá os autos ao Superior Tribunal de Justiça, para o julgamento do
recurso especial.
Art. 543-A. O Supremo Tribunal
Federal, em decisão irrecorrível, não conhecerá do recurso extraordinário,
quando a questão constitucional nele versada não oferecer repercussão geral,
nos termos deste artigo.
§ 1o Para
efeito da repercussão geral, será considerada a existência, ou não, de questões
relevantes do ponto de vista econômico, político, social ou jurídico, que
ultrapassem os interesses subjetivos da causa.
§ 2o O
recorrente deverá demonstrar, em preliminar do recurso, para apreciação
exclusiva do Supremo Tribunal Federal, a existência da repercussão geral.
§ 3o Haverá
repercussão geral sempre que o recurso impugnar decisão contrária a súmula ou
jurisprudência dominante do Tribunal.
§ 4o Se a Turma
decidir pela existência da repercussão geral por, no mínimo, 4 (quatro) votos,
ficará dispensada a remessa do recurso ao Plenário.
§ 5o Negada a
existência da repercussão geral, a decisão valerá para todos os recursos sobre
matéria idêntica, que serão indeferidos liminarmente, salvo revisão da tese,
tudo nos termos do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal.
§ 6o O Relator
poderá admitir, na análise da repercussão geral, a manifestação de terceiros,
subscrita por procurador habilitado, nos termos do Regimento Interno do Supremo
Tribunal Federal.
§ 7o A Súmula
da decisão sobre a repercussão geral constará de ata, que será publicada no
Diário Oficial e valerá como acórdão.
Art. 543-B. Quando houver
multiplicidade de recursos com fundamento em idêntica controvérsia, a análise
da repercussão geral será processada nos termos do Regimento Interno do Supremo
Tribunal Federal, observado o disposto neste artigo.
§ 1o Caberá ao
Tribunal de origem selecionar um ou mais recursos representativos da
controvérsia e encaminhá-los ao Supremo Tribunal Federal, sobrestando os demais
até o pronunciamento definitivo da Corte.
§ 2o Negada a
existência de repercussão geral, os recursos sobrestados considerar-se-ão
automaticamente não admitidos.
§ 3o Julgado o
mérito do recurso extraordinário, os recursos sobrestados serão
apreciados pelos Tribunais, Turmas de Uniformização ou Turmas Recursais, que
poderão declará-los prejudicados ou retratar-se.
§ 4o Mantida a
decisão e admitido o recurso, poderá o Supremo Tribunal Federal, nos termos do
Regimento Interno, cassar ou reformar, liminarmente, o acórdão contrário à
orientação firmada.
§ 5o O
Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal disporá sobre as atribuições dos
Ministros, das Turmas e de outros órgãos, na análise da repercussão geral.
O
Agravo do art. 544 do CPC
Às vezes, o mais simples é o mais
adequado e o mais completo. Sob qualquer critério, aquele produto seria o
melhor no confronto com outros do mesmo gênero. A mensagem, sem rebuscamentos,
era clara, sedutora e atendia perfeitamente aos propósitos a que se destinava.
Assim também acontece com a nova Lei nº 12.322, de setembro de 2010, que entrou
em vigor em dezembro do mesmo ano.
Propôs-se, o legislador pátrio, a
alterar substancialmente a sistemática do artigo 544 do Código de Processo
Civil. Para isso, em lugar da interposição do agravo de instrumento para
desobstruir as vias de acesso do Recurso Especial e do Recurso Extraordinário
até o Superior Tribunal de Justiça e o Supremo Tribunal Federal, que tenham
sido eventualmente vedadas por decisão do presidente ou vice-presidente de um
Tribunal qualquer, instituiu a possibilidade de essa desobstrução ser alcançada
por meio de um agravo tirado “nos próprios autos”.
Das
reiteradas alterações por que passou o art. 544
Para os que acompanham há mais tempo as
alterações legislativas por que passou o art. 544 ao longo dos anos, fica claro
que aquele agravo de instrumento vinha sendo utilizado pelas cortes de
superposição cada vez mais como forma de impedir o acesso do jurisdicionado à
instância excepcional. Explico: a redação original do art. 544 previa uns
poucos documentos obrigatórios necessários à formação do agravo de instrumento,
com o que o jurisdicionado tinha robustas razões para crer que, se as razões de
mérito do recurso fossem bastantes, não seria o recorrente vítima de armadilhas
formais.
Deveras, quando ainda não havia nem STJ,
nem Recurso Especial, a versão original do CPC previa apenas no parágrafo único
do art. 544 o seguinte:
Parágrafo único. O agravo de instrumento será instruído com as peças que forem indicadas pelo agravante, dele constando, obrigatoriamente, o despacho denegatório, a certidão de sua publicação, o acórdão recorrido e a petição de interposição do recurso extraordinário.
Posteriormente, a Lei nº 8.950, do
primeiro grande pacote de reformas do CPC, convolou o parágrafo único em § 1º,
dando-lhe a seguinte redação:
§ 1º O agravo de instrumento será instruído com as peças apresentadas
pelas partes, devendo constar, obrigatoriamente, sob pena de não conhecimento, cópia do acórdão recorrido, da petição de
interposição do recurso denegado, das contra-razões, da decisão agravada, da
certidão da respectiva intimação e das procurações outorgadas aos advogados do agravante e do agravado.
Mais recentemente, a Lei nº 10.352, de
2001, estatuiu, verbis:
§ 1o O agravo de instrumento
será instruído com as peças apresentadas pelas partes, devendo constar
obrigatoriamente, sob pena de não conhecimento, cópias do acórdão recorrido, da
certidão da respectiva intimação, da petição de interposição do recurso
denegado, das contra-razões, da decisão agravada, da certidão da respectiva
intimação e das procurações outorgadas aos advogados do agravante e do
agravado. As cópias das peças do processo poderão ser declaradas autênticas
pelo próprio advogado, sob sua responsabilidade pessoal.
Da comparação desses fragmentos,
percebe-se que, primeiramente, eram quatro as peças obrigatórias. Após, seis
conjuntos de documentos, tendo sido acrescentadas, na segunda versão, a cópia
das contrarrazões e a cópia das procurações outorgadas aos advogados do
agravante e do agravado. A partir de 2001, foi acrescentado mais um: a cópia da
certidão da intimação do acórdão recorrido.
Aos que não têm lembrança desse tempo,
cabe dizer que todas essas alterações legislativas não foram iniciativa pura e
simples do legislador. Ao revés, o acrescentamento dessas peças sempre se fez
por meio de construção da jurisprudência: STJ e STF passavam, de determinado
momento em diante, a considerar tais ou quais peças obrigatórias; o legislador
acolhia aquele posicionamento e o positivava no Código de Processo Civil.
A
jurisprudência defensiva influenciando o legislador
Ocioso dizer que o crescente aumento das
exigências de peças supostamente obrigatórias para o aviamento do agravo de
instrumento tendente a conferir trânsito a Recurso Especial e Recurso
Extraordinário fazia parte do esforço de construção das instâncias excepcionais
para desestimular, por todas as formas, o aviamento desses recursos e, no
limite, a sua apreciação nas instâncias de superposição, no que acabou ficando
conhecido como jurisprudência defensiva.
De mesma natureza (jurisprudência
defensiva) é o famoso prequestionamento que, sem embargo de historicamente não
constar em nossos textos constitucionais desde a Constituição de 1946, ainda
continua a ser exigido como fundamental à apreciação do cabimento dos recursos
excepcionais.
Se o agir por via da chamada jurisprudência defensiva soa legítimo,
do ponto de vista humano, dado o assombroso número de processos que desabavam
diariamente sobre os ombros dos Ministros das duas Cortes, o certo é que essas
exigências não pareciam (nem parecem) ajustar-se ao contido no ordenamento
positivo brasileiro.
Talvez por isso, e agora corretamente, o
esforço do constituinte derivado (Emenda Constitucional nº 45) e do legislador
infraconstitucional (art. 543-C) tenha sido no sentido de tentar dotar o
Direito brasileiro de mecanismos legítimos, visando a atribuir um pouco de
ordem e eficácia ao sistema recursal excepcional, limitando a revisibilidade,
uma a uma, das irresignações levadas a essas duas casas maiores.
Se as medidas preconizadas conseguirem o
efeito desejado, de redução drástica do número de recursos interpostos e
examinados, então, não será mais necessário o culto da jurisprudência
defensiva, nem da invenção de novas técnicas de indeferimento de agravos de
instrumento (v.g, o carimbo do
protocolo está ilegível na cópia trazida ao Tribunal e nenhuma certidão do
órgão da justiça ordinária pode substituir o carimbo; o pagamento do preparo
foi realizado via internet e o comprovante do pagamento “pode” ser falso,
etc.).
Há, exatamente em decorrência disso,
amplo espaço para a edição e adequada aplicação da Lei nº 12.322, de 2010, que
“transforma o agravo de instrumento interposto contra decisão que não admite
recurso extraordinário ou especial em agravo nos próprios autos”, pondo por
terra toda uma gama de precedentes defensivos. Deveras, como o agravo, agora, é
interposto nos próprios autos do processo, não há mais possibilidade teórica de
ser indicada como razão da inadmissibilidade do recurso a ausência de algum
documento tido por indispensável à formação do agravo.
É bem verdade, entretanto, que a mente
humana é muito mais imaginativa do que a lei e nada impede um Ministro da
Corte, dotado de certa criatividade, de inventar outras técnicas defensivas,
visando a não conferir admissibilidade ao recurso de agravo interposto nos próprios
autos.
Ainda recentemente, quase imediatamente
após a entrada em vigor da lei em comento, num dos primeiros agravos que teve
sua admissibilidade examinada no STJ, certo Ministro saiu-se com esta:
O protocolo de
interposição do recurso especial está ilegível (fl. 48), sendo, portanto,
imprestável para aferir sua tempestividade.
Nego, por isso, seguimento ao agravo.
Como é possível? Simples: mesmo
ocorrendo o aviamento do agravo nos próprios autos, dois procedimentos têm sido
adotados: (i) o STJ determina, sponte
sua, e por meio de seus próprios funcionários, a digitalização dos recursos
que chegam à Corte, com a devolução dos autos ao tribunal de origem; ou (ii) o
próprio tribunal recorrido digitaliza integralmente os autos e remete por meio
eletrônico para o STJ.
Nas duas hipóteses, o recorrente não
possui nenhuma forma de controlar o procedimento de digitalização (nem tem como
fazê-lo). A perpetuar-se o absurdo,
ficará o jurisdicionado sem armas para lutar contra essa nova e perversa forma
de jurisprudência defensiva, que condena o requerente a residir no sol.
Sem embargo disso, é certo que será
necessária muita criatividade para ressuscitar todas as técnicas defensivas das
instâncias de superposição. Enquanto elas não vêm, convém saudar e aplicar a
nova lei.
Da nova regência legal e seus desdobramentos
O Texto da Lei nº 12.322, de 2010, na
parte pertinente aos recursos excepcionais, tem este teor:
Art. 544. Não admitido o recurso extraordinário ou o
recurso especial, caberá agravo nos próprios autos, no prazo de 10 (dez) dias.
§ 1o O agravante deverá interpor
um agravo para cada recurso não admitido.
[foi mantida a anterior redação do § 2º].
§
3o O agravado será intimado, de
imediato, para no prazo de 10 (dez) dias oferecer resposta. Em seguida, os
autos serão remetidos à superior instância, observando-se o disposto no art.
543 deste Código e, no que couber, na Lei no 11.672, de 8 de maio
de 2008.
§ 4o No Supremo Tribunal Federal e
no Superior Tribunal de Justiça, o julgamento do agravo obedecerá ao disposto
no respectivo regimento interno, podendo o relator:
I - não conhecer do agravo manifestamente inadmissível ou
que não tenha atacado especificamente os fundamentos da decisão agravada;
II - conhecer do agravo para:
a) negar-lhe provimento, se correta a decisão que não
admitiu o recurso;
b) negar seguimento ao recurso manifestamente
inadmissível, prejudicado ou em confronto com súmula ou jurisprudência
dominante no tribunal;
c) dar provimento ao recurso, se o acórdão recorrido
estiver em confronto com súmula ou jurisprudência dominante no tribunal.
(NR)
Art.
545. Da decisão do relator que não conhecer
do agravo, negar-lhe provimento ou decidir, desde logo, o recurso não admitido
na origem, caberá agravo, no prazo de 5 (cinco) dias, ao órgão competente,
observado o disposto nos §§ 1o e 2o do art.
557. (NR)
Presente o texto da lei, a primeira
observação a ser feita é a de que o novo agravo, nos próprios autos, é fruto da
transformação do agravo de instrumento (assim diz a ementa). Vale o registro de
que os advogados, na elaboração do recurso, não precisam nem devem nominá-lo
como “agravo nos próprios autos”, basta que escrevam agravo. O complemento “nos
próprios autos” tem pertinência com a forma ou com o locus da interposição, mas não com a denominação do recurso.
Com isso, já é possível deduzir que me
incluo entre aqueles que abominam a expressão agravo inominado. Havendo sido
dito que é agravo, então já se trata de recurso nominado, recurso de agravo!
Agravo inominado é uma contradição essencial. A maneira, a forma como se
processa o recurso, mero adjunto, não faz parte da nominação.
Não por outro motivo, o legislador
somente utilizou a expressão “nos próprios autos”, no caput do art. 544, para contrapor ao que acontecia até o momento
anterior à entrada em vigor da lei, em que o agravo era tirado por via de
instrumento. Depois dessa menção inicial, em todos os outros fragmentos da lei,
limitou-se o legislador à expressão agravo.
Sem
embargo disso, convém mencionar que a expressão agravo no auto do processo
(correspondente a agravo nos próprios autos) é de larga tradição histórica no
direito luso-brasileiro. Deveras, as Ordenações Manoelinas de 1521[14] já a ele se referiam no Livro III, 54, § 8, e 77.
Foi reafirmado na Carta Régia de 1526 e mantido nas Ordenações Filipinas, Livro
III, Tit. 20. Desprezado no nosso Regulamento nº 737, de 1850, reapareceu no
Código de Processo Civil de 1939 (art. 851).
Ainda
que possa parecer ocioso, convém deixar anotado que esse agravo que objetiva o
trânsito dos recursos excepcionais não se confunde com o agravo retido de que
cogita o art. 522 do Código de Processo Civil. Este último, que é aviado de
sorte a obstar a preclusão de matérias deliberadas pelo juiz do primeiro grau
de jurisdição, somente é apreciado em “preliminar” de apelação, enquanto que o
agravo do art. 544 tem tramitação e exame imediatos, ressalvada a incidência do
art. 543-C, do Código de Processo Civil.
No que concerne ao procedimento, esse
ficou bastante simplificado. O agravo é tirado perante a autoridade judiciária
que negou trânsito ao Recurso Extraordinário ou ao Especial, ou a ambos, no
prazo de dez dias contados da intimação da decisão denegatória, sendo que, se
houver ocorrido a denegação de ambos os recursos excepcionais, deverá ocorrer a
interposição de dois recursos de agravo, um para cada decisão contrária. Como
há expressa referência ao art. 543 do Código de Processo Civil, deve ficar
claro que, em qualquer hipótese (agravo
de não-admissão do Extraordinário, agravo de não-admissão do Especial, agravo
de não-admissão de ambos), os autos do processo deverão ser primeiramente
encaminhados ao STJ para exame, ou do Especial ou do agravo interposto e,
somente após essa atividade serão encaminhados ao STF, se for o caso, dado que
a decisão do STJ pelo integral provimento do recurso Especial pode tornar
desnecessária a remessa à Corte Maior.
A redação do § 2º do art. 544 não sofreu
alteração em decorrência da Lei 12.322, sendo mantido, inexplicavelmente, este
teor:
§ 2º A petição de agravo será dirigida à
presidência do tribunal de origem, não dependendo do pagamento de custas e
despesas postais. O agravado será intimado de imediato para no prazo de 10
(dez) dias oferecer resposta, podendo instruí-la com cópias das peças que
entender conveniente. Em seguida, subirá o agravo ao tribunal superior, onde
será processado na forma regimental.
Ora, pelo menos duas razões de ordem
sistemática não autorizariam a mantença do dispositivo, tal como se encontra
redigido. Primus, parcela da redação
desse fragmento legal foi trasladada para o § 3º. Confira-se, em ambos os
parágrafos, este trecho: O agravado será intimado de imediato para no prazo de
10 (dez) dias oferecer resposta. Tem-se
uma redundância legiferante que somente pode ser creditada a um descuido do
legislador; secundus, o novo perfil
do agravo, agora nos autos, pelo menos em uma primeira leitura, não sugere que
o agravado possa ou deva instruir sua resposta com “cópias das peças que
entender conveniente.” Todas as peças estarão, pela própria forma eleita pelo
legislador, encartadas nos autos.
O fragmento não é, entretanto, de todo
desnecessário. Têm valia a indicação procedimental de que o agravo deve ser
dirigido ao presidente do Tribunal de origem e a referência ao não-pagamento de
custas e despesas postais.
Vale
a anotação, aqui, de que o § 4º, na esteira, aliás, do que tem sido a tendência
do processo civil brasileiro nos três últimos lustros, atribuiu ainda mais
poder ao relator do recurso de agravo. Com efeito, os poderes do relator ganham
maior dimensão.
O
Ministro relator terá poderes para (1) não conhecer do agravo: (1.1)
manifestamente inadmissível; ou (1.2) que não haja hostilizado os fundamentos
da decisão agravada; (2) conhecer do agravo para: (2.1) no mérito, negar-lhe
provimento, se entender que a decisão de inadmissão do REsp ou do RE está
correta; (2.2) negar seguimento ao REsp ou RE manifestamente inadmissível,
prejudicado ou em confronto com súmula ou jurisprudência dominante do Tribunal;
(iii) dar provimento; (3) dar provimento ao RE ou REsp se o acórdão recorrido
estiver em confronto com súmula ou jurisprudência dominante no tribunal.
Cotejado
com a redação anterior, o novo § 4º deu tratamento sistemático à matéria que
antes se encontrava no antigo § 3º, cuidando, agora, tanto de hipóteses em que
o Relator deve não conhecer do agravo como daquelas em que deve examiná-lo. A
regência anterior cuidava apenas das hipóteses, positivas, de conhecimento do
agravo e de provimento direto do REsp ou do RE. Se a conclusão do relator
divergisse de uma dessas duas atitudes, então a solução deveria ser buscada no
art. 557 do CPC.
É
certo que o tratamento atual é mais sistemático, mas ainda assim contém
equívoco de natureza justamente sistemática. Deveras, é exato afirmar que não
se deve conhecer de agravo manifestamente inadmissível ou que não tenha atacado
os fundamentos da decisão agravada, em violação ao requisito extrínseco da
regularidade
formal. Não é exato, entretanto, estabelecer que o
relator deve conhecer do agravo para (b) negar seguimento ao recurso
manifestamente inadmissível, prejudicado ou em confronto com súmula ou
jurisprudência dominante no tribunal.
A
dicção dessa alínea ‘b’ sofre de ausência de paralelismo em relação à alínea
‘a’, antecedente. Com efeito, nesta última, o relator conhece do agravo e lhe
nega provimento. Ora, então, na ‘b’, antes citada, o relator deveria, em
primeiro plano, conhecer e dar provimento ao agravo. Feito isso, passaria ao exame do RE ou do
REsp e lhe negaria seguimento porque inadmissível (por motivo diverso daquele
invocado pelo presidente ou vice-presidente do tribunal ordinário, dado que, se
fosse pelo mesmo motivo, a hipótese seria da alínea ‘a’); somente assim o texto
obedeceria ao critério instituído pela norma mesma.
Matéria
que merece consideração é a relativa à possibilidade de retenção dos atos no
tribunal de origem. Deveras, a referência, no novo parágrafo terceiro, à Lei nº
11.672, de 2008, dá conta da possibilidade de o recurso não ter tramitação
imediata. Pode ficar sobrestado por força do fato de que, aplicada à espécie o
art. 543-C, somente serão encaminhados à instância de superposição aqueles
recursos representativos da controvérsia. Os demais ficam sobrestados (diz a
lei: suspensos) até o pronunciamento definitivo do Superior Tribunal de
Justiça.
Outro
aspecto a ser realçado e que representa consequência direta do ajuste da
legislação infraconstitucional ao que disposto na Emenda Constitucional nº 45,
que instituiu a repercussão geral como requisito de admissibilidade do Recurso
Extraordinário, tem pertinência com o disposto no art. 543-B do Código de
Processo Civil: o legislador estabeleceu que, quando houvesse multiplicidade de
recursos em que tivesse sido agitada a mesma controvérsia, o tribunal de origem
selecionaria um ou mais recursos e os encaminharia ao STF. Os demais ficariam
sobrestados na instância a qua.[15]
Assim,
no que concerne ao represamento do Recurso Extraordinário, no tribunal
ordinário, por força da aplicação do citado art. 543-B do CPC, depois de alguma
hesitação inicial, a jurisprudência fixou-se no sentido de que não cabe nem
agravo de instrumento nem Reclamação na hipótese de ocorrência de algum
equívoco quanto ao sobrestamento de que cogita esse artigo, na hipótese de
multiplicidade de recursos com fundamento em idêntica controvérsia. Apenas a
título de exemplo, traz-se este recente julgado do STF:
RECLAMAÇÃO. USURPAÇÃO DE COMPETÊNCIA DO SUPREMO
TRIBUNAL FEDERAL. ALEGAÇÃO DE EQUÍVOCO NA APLICAÇÃO DA REPERCUSSÃO GERAL PELO
TRIBUNAL DE ORIGEM. INOCORRÊNCIA. AGRAVO IMPROVIDO. I – A jurisprudência do
Supremo Tribunal Federal firmou-se no sentido de que não é cabível a reclamação
para corrigir eventual equívoco na aplicação da repercussão geral pela Corte de
origem.[16]
Parece-nos
que esta não é a melhor solução. Deveras, mesmo não sendo o caso de agravo nos
autos (e realmente não o é, porque sobrestar recurso não significa negar
seguimento, única hipótese que autoriza o agravo do art. 544), parece que a
alternativa natural seria a reclamação para firmar a competência do STF:
entretanto, o entendimento atual tem sido o de que a solução terá de ser
encontrada no próprio tribunal de origem. Como se trata de decisão da
presidência ou vice-presidência do tribunal, a medida a ser adotada, um agravo
interno, deverá ser objeto de exame pelo plenário da casa ou, onde houver, pela
corte especial.
Desnecessário
afirmar que esse órgão último, em brevíssimo tempo, ficará com as pautas
inteiramente tomadas somente com o exame de matérias dessa natureza.
Postas essas considerações a respeito do
novo art. 544, parece lícito concluir que a ideia do legislador, ao proceder à
transformação do agravo de instrumento para permitir trânsito ao Recurso
Especial e ao Recurso Extraordinário, há de ser acatada como alvissareira por
quantos militam na prática diária da advocacia. Sem embargo disso, não está
afastado o receio de que os tribunais superiores continuem a conceber novas e
desnecessárias técnicas defensivas, objetivando a denegação de seguimento dos
agravos interpostos por meio dessa nova modalidade, sobretudo em face da
digitalização dos autos que, como já se viu, não é matéria afeta aos advogados
que patrocinam os feitos e que não têm nenhum poder de fiscalização a exercer.
[1]
Apud
MEDINA, 2002, p. 28.
[4]
Estudos de História do Processo: Recursos. Osasco: FIEO, 1996, p. 80
[5]
Apud,
MEDINA 2002, p.30.
[6]
Cf. CORTES, 2003, p. 22.
[7] Diversamente do que aqui sustentado, Nelson
NERY considera o reexame necessário uma condição de
eficácia da sentença.
[8]
Para quem trabalha com a teoria dos três planos (da existência, da validade e d
eficácia), há evidente distinção entre pressupostos, que são relativos ao plano
da existência, e requisitos (ou elementos) que são relativos ao plano da
validade. O Código de Processo Civil, entretanto, toma um termo por outro,
razão por que dispensamo-nos de realizar qualquer discrímen.
[9]
O parágrafo único do artigo 9º tinha esta redação:
Haverá também recurso para
o Supremo Tribunal Federal das sentenças definitivas proferidas pelos tribunaes
e juízes dos Estados:
a)
Quando a decisão houver sido contraria á
validade de um tratado ou convenção, à aplicabilidade de uma lei do Congresso
Federal, finalmente, à legitimidade do exercício de qualquer autoridade que
haja obrado ooem nome da União — qualquer que seja a alçada.
b)
Quando a validade de uma lei ou acto de qualquer
Estado seja posta em questão como contrário à Constituição, aos tratados e às
leis federaes e a decisão tenha sido em favor da validade da lei ou acto;
c)
Quando a interpretação de um preceito
constitucional ou de lei federal, ou da clausula de um tratado ou convenção,
seja posta em questão, e a decisão final tenha sido contrária à valide do
título, direito ou privilegio ou isenção, derivando do preceito ou cláusula.
[10]
Mantida a grafia da época para todos os textos históricos.
[11]
A redação é extremamente semelhante à do já citado Decreto nº 510, com a
diferença de que, no Decreto, tratava-se exclusivamente de decisões da justiça
federal.
[12]
A argüição de relevância foi alçada à estatura constitucional com Emenda
Constitucional nº 7, de 1977, cabendo ao STF estabelecer, em seu regimento, o
processo e julgamento dessa argüição.
[13]
Cf. Mancuso, Rodolfo de Camargo. Recurso extraordinário e especial. P. 65.
[14]
A rigor, houve duas edições anteriores dessas Ordenações, em 1512 e 1514, mas
foram mandadas destruir, por erro de tipografia.
[15]
O relativo varia em latim, por isso, instância a qua e não a quo. Esta
última forma somente se aplica se o termo a que se refere o relativo for
masculino ou neutro.
[16]
AgR na Rcl 11250/RS,
Relator(a): Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Julgamento: 07/04/2011.
Tribunal Pleno, DJe-125 DIVULG 30-06-2011
PUBLIC 01-07-2011.