quinta-feira, 1 de julho de 2010

NASCEU O ANTEPROJETO DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL

No dia 8 do mês em curso, foi entregue, pela Comissão de Juristas instituída especialmente para esse fim, o anteprojeto de novo Código de Processo Civil. Finalmente a comunidade acadêmica teve acesso ao tão esperado texto do projeto, dado que, até então, eram conhecidas apenas as ideias gerais que animavam a comissão, mas ocultas as formas pelas quais essas ideias seriam concretizadas.

Espera-se, agora, que os ventos democráticos que sopram no País há já algum tempo se façam mais fortes e seja criado espaço para o real debate tanto sobre a estrutura proposta quanto sobre os diversos dispositivos trazidos no anteprojeto. Vale anotar, entretanto, que, qualquer leitura que se faça não pode permitir a esperança de que o anteprojeto seja panaceia para todos os males da prestação jurisdicional brasileira, sabidamente morosa, ineficiente, em todos os graus de jurisdição (exceção feita à Justiça do Trabalho que, nas instâncias ordinárias, consegue dar uma resposta ao cidadão em prazo razoável).


Qualquer que venha a ser a versão final do Código, não serão solucionados, por essa via, os problemas relativos à falta de estrutura do Poder Judiciário (relação número de processos/juiz), à ausência de competência na gestão administrativa da prestação jurisdicional (um bom juiz não pressupõe um bom administrador), ao treinamento de pessoal de Secretaria, aos critérios e ao processo de seleção de magistrados, etc.


Enfim, não se pode comprar a ideia de que o novo Código vai resolver todos os nossos problemas. A garantia da duração razoável do processo, que é direito fundamental, vai continuar à espera de outros implementos de responsabilidade do Estado.


Sem embargo disso, e ferindo direto o ponto, a versão trazida a lume apresenta a vocação de perseguir um máximo de sistematicidade e efetividade. Contempla uma parte geral que, além dos temas tratados usualmente, em títulos da espécie, reproduz e reafirma princípios constitucionais relativos ao processo civil, dá dignidade à cooperação processual, abre espaço para a regulação da Defensoria Pública e da Advocacia Pública.

No livro que regula o processo de conhecimento (além da adequada regência da produção antecipada de prova, da exibição e da justificação, que no Código atual são regidas no Livro III, que cuida do processo cautelar), destaque deve ser dado à busca da conciliação como elemento primordial da solução de controvérsias, imediatamente após a propositura a demanda, cuja regulação é superior ao sistema vigente, além do que, vários dos procedimentos especiais que hoje se encontram no Livro IV (em homenagem a uma suposta pureza metodológica) foram trazidos para esse livro.

Também o processo de execução mereceu, no anteprojeto, sistematização mais adequada e voltada para a efetividade da prestação jurissatisfativa. No que concerne aos recursos, além da eliminação dos embargos infringentes e do agravo retido, houve a redução do âmbito da aplicação do agravo de instrumento (aliás, há uma espécie de sina sanfônica desse recurso, desde suas origens mais remotas no direito português, que o aboliu para os processos iniciados a partir de 2008) e algumas inovações bastante interessantes com relação ao recurso extraordinário e ao recurso especial (especialmente arts. 947 a 949). Registro, entretanto, que as próprias Cortes superiores, no passado, inviabilizaram fragmentos do Código de Processo atual. Com efeito, os operadores do Direito menos jovens hão de lembrar da original redação do então parágrafo único do art. 544 do Código de Processo Civil que veio sendo anabolizada, de forma desautorizada, pelo STF, fazendo com que o legislador se ajustasse, posteriormente, às exigências jurisprudenciais, numa espécie de processo legislativo às avessas. Se o fizeram no passado e se continuam fazendo no presente, criando óbices de todo o tipo à admissibilidade de recursos excepcionais, não há nada que nos autorize a crer que esses novos ventos do anteprojeto sejam capazes de colocar freios na criatividade da jurisprudência defensiva da chamada instância de superposição.

A nossa palavra final é a de admitir, com o poeta, que o novo sempre vem, embora não signifique salvação da Jurisdição, a lembrar o velho Rui sobre ser a justiça tardia verdadeira injustiça qualificada!


JORGE AMAURY MAIA NUNES

Professor da Faculdade de Direito da Universidade de Brasília

Doutor em Direito pela Faculdade de Direito do Largo de São Francisco

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