segunda-feira, 7 de maio de 2012

Providências preliminares e Julgamento conforme o estado do processo

Providências preliminares




Na praxe forense civil, é usual aplicação da expressão réplica que seria um ato por meio do qual o autor teria o direito de contestar a contestação. Esse direito, por óbvio, não existe. O de que trata o Código de Processo Civil é das chamadas providências preliminares que assim estão especificadas na lei: (i) do efeito da revelia, que acaba de ser estudada; (ii) da declaração incidente; (iii) dos fatos impeditivos, modificativos ou extintivos do pedido; (iv) das alegações do réu.

As providências preliminares ainda se ajustam à fase postulatória e o seu cumprimento, quando for o caso, tem pertinência com a estabilização objetiva do processo.

Afirma o artigo 325 que se o réu contestar o direito que constitui fundamento do pedido, o autor poderá requerer, no prazo de 10 (dez) dias, que sobre ele o juiz profira sentença incidente, se da declaração da existência ou da inexistência do direito depender, no todo ou em parte, o julgamento da lide. Como se vê, isso acontece se o réu hostilizar o fato gerador da demanda, a causa petendi. Se o autor não promover o pedido de declaração incidente, essa matéria poderá permanecer eternamente em aberto, e poderá sempre ser suscitada em nova demanda entre as mesmas partes, dada a disposição contida no artigo 469, III, do CPC , que diz não fazer coisa julgada a apreciação de questão prejudicial decidida incidentemente no processo.

É de bom aviso, pois, que o autor lance mão do disposto no artigo 325 e requeira ao juiz que sobre essa questão profira sentença incidente, para que sobre a decisão se derramem os efeitos da coisa julgada material, na forma do artigo 470 do CPC, que soa, in verbis: Faz, todavia, coisa julgada a resolução da questão prejudicial, se a parte o requerer (arts. 5º e 325), o juiz for competente em razão da matéria e constituir pressuposto necessário para o julgamento da lide.

Vê-se, portanto, que a propositura da ação declaratória tem o condão de aumentar o judicium do juiz naquela relação processual, embora não lhe tenha aumentado a cognitio. Vale o registro lateral de que o réu também pode promover ação declaratória incidental, ainda que o Código somente se refira ao autor. Em qualquer dos casos, e ainda que não haja expressa disposição no CPC a respeito, é importante compreender que, se ocorrer a propositura da ação declaratória incidental, deverá o magistrado determinar a oitiva da parte adversária quanto ao pedido, podendo esta apresentar a defesa que tiver.

No que concerne às providências preliminares previstas no artigo 326 (resposta a fatos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito do pedido), a parte final deste dispositivo é equivocada, dado que a lei disse menos do que gostaria de ter dito. Com efeito, lá está afirmado que o juiz faculta à parte a produção de prova documental. Não! A parte pode opor-se a esses fatos mediante a produção de qualquer tipo de prova. Qualquer prova admitida em direiro; não só documental. E isso porque, muitas vezes, a maneira que o autor tem de provar a não-ocorrência de fatos impeditivos, modificativos ou extintivos do seu direito pode ser a prova testemunhal, ou, também, uma prova pericial.

A qualquer defesa contra o processo, daquelas enumeradas no artigo 301, cabe a adoção das providências preliminares do artigo 327, mandando o juiz que seja ouvida a parte autora, facultando-lhe a produção de qualquer tipo de prova (aqui o mesmo equívoco legislativo foi cometido, ao limitar o direito da parte à produção da prova documental). É sabido que no art. 301 o legislador colocou, lado a lado, tanto preliminares de natureza dilatória, como outras de natureza peremptória. Algumas delas, permitem sanação, outras conduzem à morte do processo.

Se verificar a ocorrência de nulidade sanável, o juiz manda supri-la no prazo de até 30 dias. Se não for sanável, a regência da matéria é remetida ao artigo 329 (extinção sem julgamento de mérito) a ser examinado logo mais.


Julgamento conforme o estado do processo


 

O capítulo em questão trata de três distintas figuras, excludentes entre si, de sorte que somente uma delas pode ser aplicada pelo magistrado relativamente a determinada relação processual.

Na primeira das modalidades, nominada singelamente de extinção do processo, se ocorrer qualquer das hipóteses previstas nos arts. 267 e 269, II a V, o juiz declarará extinto o processo.

Estão presentes, aí, duas figuras, relativamente a (i) sentenças meramente processuais; e (ii) sentenças em que, ou há resolução de mérito, ou se trata de falsas sentenças de mérito, como gosta de apelidá-las Cândido Dinamarco. Com relação à primeira figura, já se disse que algumas das preliminares processuais indicadas no artigo 301 têm a capacidade de extinguir o processo; outras não. Se não está presente no processo nenhuma das preliminares de natureza peremptória, o processo tem chance de progredir, de ser julgado no mérito. Se ao revés, se trata de preliminares de natureza dilatória (a existência de um pressuposto litisingresso impediente, como a ocorrência de coisa julgada, por exemplo), obrigatoriamente incidirá o artigo 329, devendo o juiz proferir uma sentença meramente processual, extinguindo o processo sem resolução de mérito.

Com relação à segunda figura, haverá a prolação de falsa sentença de mérito quando, por exemplo, o juiz homologar a transação, e verdadeira sentença de mérito quando o juiz pronunciar a decadência.

Se não couber a aplicação de nenhuma das situações previstas no artigo 329, passa-se ao exame da segunda modalidade, nominada julgamento antecipado da lide, regida pelo artigo 330 do CPC que soa, in verbis: O juiz conhecerá diretamente do pedido, proferindo sentença:

I – quando a questão de mérito for unicamente de direito, ou, sendo de direito e de fato, não houver necessidade de produzir prova em audiência;

II – quando ocorrer a revelia (artigo 319).

Cabem dois registros a esse respeito: não há questão somente de direito. Toda questão é de direito e de fato, até porque, consoante a teoria tridimensional, direito é fato, norma e valor. O que ocorre é que, às vezes, os fatos se tornam incontroversos. Na hipótese do inciso II, o legislador cuidou de revelia, mas como já examinado anteriormente, deveria ter cuidado de efeitos da revelia, e não da revelia (!) até para harmonizar esse dispositivo com a regra do artigo 324, antes estudada.

Igualmente, se não couber a aplicação do artigo 330, passa-se ao exame e aplicação do artigo 331, da audiência preliminar, que tem a seguinte dicção:

"Artigo 331. Se não ocorrer qualquer das hipóteses previstas nas seções precedentes, e versar a causa sobre direitos que admitam transação, o juiz designará audiência preliminar, a realizar-se no prazo de trinta dias, para a qual serão as partes intimadas a comparecer, podendo fazer-se representar por procurador ou preposto, com poderes para transigir.

§ 1º Obtida a conciliação, será reduzida a termo e homologada por sentença.

§ 2º Se, por qualquer motivo, não for obtida a conciliação, o juiz fixará os pontos controvertidos, decidirá as questões processuais pendentes e determinará as provas a serem produzidas, designando audiência de instrução e julgamento, se necessário.

§ 3o Se o direito em litígio não admitir transação, ou se as circunstâncias da causa evidenciarem ser improvável sua obtenção, o juiz poderá, desde logo, sanear o processo e ordenar a produção da prova, nos termos do § 2o."

Muito provavelmente, a obrigatoriedade de realização dessas audiências, como disposto no caput, iria assoberbar a pauta dos juízes. Isso, aliás, já estava acontecendo, razão mais do que suficiente para que o legislador (Lei nº 10.444, de 2002), oito anos após a reforma por que passou, em 1994, o Código de Processo Civil, fizesse adicionar um § 3º a esse artigo, flexibilizando a obrigatoriedade da audiência preliminar . É bom recordar que uma das razões do reconhecido fracasso do procedimento sumaríssimo, tal como veio originalmente no CPC de 1973, foi justamente a necessidade de realização de audiência, sem que houvesse datas disponíveis para tanto. O que era infortúnio de uns poderia passar a ser desgraça de todos, máxime porque a lei era expressa a respeito da necessidade de designação da audiência de conciliação.

Bem é de ver, também, que o caput do artigo, na versão da reforma de 1994, dizia mais do que queria dizer, pois conduzia à ilação de que, se tratasse de direitos indisponíveis não deveria ser tentada a conciliação. Esta era a dicção legal: “Se não se verificar qualquer das hipóteses previstas nas seções precedentes e a causa versar sobre direitos disponíveis, o juiz designará audiência de conciliação.”

Ora, o que é impossível quanto aos direitos indisponíveis é a renúncia e a confissão. Não raro, porém, os direitos patrimoniais que deles defluem podem e devem ser objeto de conciliação. Confira-se a esse respeito o modelo seguido na Justiça do Trabalho que, em regra, cuida de direitos irrenunciáveis. Bem andou, por isso, o artífice da lei nº 10.444, antes mencionada, ao alterar a redação do fragmento legal antes transcrito, explicitando que se a causa versar sobre direitos que admitam transação a audiência preliminar pode ser realizada. Dizendo de outra forma: quanto à expressão admitir transação, há de ser observado que existem direitos indisponíveis transacionáveis e outros não transacionáveis. Os direitos da personalidade são indisponíveis e não-transacionáveis. O direito a alimentos é indisponível, mas pode ser negociado seu valor, sua quantia.

No que concerne ao prazo de trinta dias (que não é cumprido na maioria das vezes) para a realização da audiência, não há a especificação do dies a quo. Não é, todavia, difícil localizá-lo: se não houver providências preliminares a adotar (e, obviamente, não for o caso dos arts. 329 e 330), o prazo para a realização da audiência conta-se a partir da juntada da contestação; se necessária a adoção das providências preliminares, o prazo deve ser contado a partir da prática dessas providências ou após a exaustão do prazo fixado para tanto (art. 324, e 325 a 327).

Obtida a conciliação, será ela reduzida a termo e homologada por sentença, extinto o processo com julgamento de mérito.

O novo § 2º do art. 331 pode induzir ao entendimento de que, na mesma audiência, se não lograr conciliar as partes, deverá o magistrado implementar as atividades ali previstas. A uma porque o parágrafo em causa constitui nítida explicitação do desdobramento da audiência prevista no caput. A duas porque, já se disse, o objetivo da reforma foi distribuir uma justiça mais célere, mais eficaz e mais justa. A interpretação que se concilia com esse desiderato é justamente a que entende como necessária a continuidade da audiência para que o juiz fixe os pontos controvertidos , decida as questões processuais pendentes, determine as provas que devam ainda ser produzidas, e designe a audiência de instrução e julgamento, se necessário.

É claro que interpretação em outro sentido (ou seja, no de que a atividade que deve se seguir à tentativa de conciliação, deve se realizar em momento posterior à audiência) também é possível. A própria história da inovação seria bastante para essa demonstração. É que o Anteprojeto de 1985, no § 2º do art. 331, dispunha que na mesma sessão o juiz fixaria o objeto da demanda e os pontos controvertidos e designaria audiência de instrução e julgamento, decidindo sobre as provas a serem produzidas. Ora, é de sabença trivial que o Anteprojeto de 1985 foi a maior fonte de inspiração do legislador da reforma de 1994, que dele reproduziu artigos inteiros, ipsis verbis. Pois bem, no caso do art. 331, embora haja copiado a idéia, o legislador retirou do § 2º a expressão na mesma sessão, o que leva à conclusão de que optou pela vertente que indica que as atividades subsequentes devem (ou podem) ser realizadas num momento posterior.

Parece que esta última deve ser a posição a ser adotada, já por força do argumento supra, já porque a prática, o dia-a-dia não, se compadece com a outra orientação. Realmente, por mais bem preparado que seja o órgão do Judiciário, nem sempre são de fácil deslinde as chamadas questões processuais pendentes, às vezes a exigir muitas horas de investigação, tempo incompatível com as pautas apertadas dos magistrados.

Não se quer com isso estimular praxes divorciadas do Código de Processo Civil, como sói ocorrer no foro: despachos inúteis e não previstos em lei, do tipo diga o autor sobre a contestação (quando, às vezes, não e o caso), ou especifiquem provas, indicando desde logo sua finalidade, e que já foram indicadas na inicial ou na contestação. É bem verdade que o Código de Processo Civil contribuiu para descalabros desse jaez. Com efeito, o artigo 451, que trata da audiência de instrução e julgamento dispunha (rectius, dispõe porque não foi revogado pelo legislador da reforma) que ao iniciar a instrução, já na audiência, o juiz fixará os pontos controvertidos sobre que incidirá a prova.

Ora, na audiência, a prova que se produz é somente a pessoal, das partes, testemunhas e peritos. Tardia, pois, a fixação dos pontos controvertidos, se feita no momento preconizado no artigo 451. De aplaudir, portanto, a alteração que traz a fixação dos pontos controvertidos para o saneador — observe-se que o artigo não mais fala em saneado o processo; a rubrica da seção, porém, não foi alterada —, na esteira do que à época preconizado no Código de Processo Civil de Portugal, artigos 510 e 511, só que lá com muito maior detalhamento.

Todo esse raciocínio parte da premissa de que na inicial e na contestação autor e réu indicam as provas que pretendem produzir. É bem verdade que a necessidade absoluta da prova somente se estabelece após os termos da contestação e, às vezes, após a réplica do autor (quando o réu haja arguído fatos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito do autor). Veja-se bem que não se cuida mais, como na sistemática anterior, de deferimento de provas pelo juiz. Agora ele determina as provas a serem produzidas. Determina que o autor prove o fato controvertido a ou b, mediante a utilização do meio probatório hábil para tanto.

A regra relativa à fixação dos pontos controvertidos é cópia mal-feita do Código de Processo Civil de Portugal. Lá o magistrado faz questionário a respeito dos pontos controvertidos, e, por isso mesmo, é capaz de verificar o que ainda falta ser provado. O magistrado sabe qual prova ainda é necessária e quem há de dela desincumbir-se Do exame do questionário percebe se já há certas matérias provadas e que não mais necessitam da produção de provas. A ideia aqui é a mesma, só que não tão bem escrita. De qualquer maneira, deve o magistrado, nesse momento, fixar os pontos controvertidos sobre os quais ainda há necessidade de produção de prova, determinando-as e designando audiência de instrução e julgamento se houver necessidade de produção de prova oral

O mesmo dispositivo cuida do ponto alto da fase saneadora do processo ao reportar-se ao fato de que, neste momento, o juiz ‘decidirá as questões processuais pendentes’. Sanear é sanar os vícios, limpar o processo, para que possa prosseguir sua marcha sem máculas.

Depois eu conto o resto...

3 comentários:

  1. Ei professor, assim não vale!!!!
    Você tinha que contar tudo pra gente antes da prova, esse "Depois eu conto o resto..." é injusto!!!!!

    No mais, as suas explicitações neste blog servem como uma ótima fonte de revisão da matéria, parabens!

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  2. Tudo bem, mas... depois eu conto o resto.

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  3. Adorei, a matéria foi muito esclarecedora.

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